25.1.11

jindungo

Culinária Genealógica

O menino veio à luz com cara de joelho
a mãe era um presunto e o pai um farofero
o avô era feijão bem preto
e as tias arroz salteado
a filha era meu pedaço de filé
e todo mundo vivia dizendo
oh portuga você é um prato
de porcelana azul e branco craquelê

Sor Flamengo

Secret Aria

Docu-
Mentos
e coca-cola
sobre (a)
mesa
oh
secret
aria
amor
desalento
dos meus finais
de seman
aaaaaa
vou aí
bota e saia alta
e sê me traz
meu Docu
mento nem me
sento
e aban
dono
minha secret
aria


Henrique

Santo

Todos os benefícios somados segundo as respectivas intensidades subtraídos de todos os malefícios deixaram-me de bolsos vazios de ponta de orgulho ou recordação prazerosa que me alegrasse. Passei a degustar com felicidade as maiores provações e angústias e o meu peito encheu-se de melancolia e suspiros. Passei a vaguear entre os baldios conversando com os anjos do Senhor e praticando a renúncia. Alimentava-me de raízes e bebia dos lagos poluídos nas redondezas da grande cidade.

Filipe Elites

Arabescos

São João

Só vejo o bem por todo o lado. A ordem da disposição das montanhas e dos penedos, a alvura da lua na superfície do mar,o aroma da transpiração da vegetação. Os seus olhos brilham e a lua grita lá fora cheia de noite. Não sei se me sinta mais forte ou mais fraco, penso que perco e ganho forças na sua presença. Inspiro fundo e tento compreender a verdade nas subtilezas do seu sobrolho. O sangue atropela-se nas veias como um mar vermelho violento e queda-se em muralha antes de chegar ao coração num pico de êxtase quando as palavras me chegam aos lábios - quero ficar em tua casa.

Lúcia

Prece

Invoco as constelações e todos os deuses
de religiões postergadas para que assolem
nossos beijos e que incendem nossos corpos
preencham de sentido nossos silêncios
e afoguem as negras comuns memórias

André Istmo

Absolut Deluxe

Et Voilà
envolto em prada
vivo
só manhãs e noites
activo intenso
de madrugada
envolto
a silhueta delgada
de braços levantados às estrelas
em champanhe e lantejoilas
sushi, glamour, se não me beijas
olha-me nos olhos
blackjack, magias negras
morenas brancas loiras
jovens noivas velhas
fogo oco fogo oco
eu lanço os dados e elas de gatas
anestesiada aconsciência
estética Dior, luxúria platinada
cortou a gravata
saia pelas traseiras
a ética bêbada
carpetes, motivos orientais
peles, olhares ornamentais
tequillas, vinho, caipirinhas
perfumes, tecidos, ideias
falsas - amor nas prateleiras
amor servido em bandejas

Nicolau Divan

Dúvidas Violentas

A menina com dúvidas na matéria
bateu à porta do professor
que a elevou à luz
da piscina em que afogou a ignorância
e depois do 4 entrou o 10
e a ignorância diluiu-se entre o choro
na alegria da menina com dúvidas na matéria
que bateu à porta do professor
que a arrastou de 4 à piscina
e a violência deu lhe 10
e a luz deu sede de vingança
e uma piscina de choro
bateu à porta da menina
com dúvidas na miséria
da casa do professor
que a arrastou sem matéria
numa disciplina de ignorância
entre o choro e a vingança
e a inocência diluiu-se em ódio
e a vingança da menina virou luz
e na matéria bateu com alegria
e sem dúvidas afogou o professor

Lúcio Ferro

3.1.11

Timóteo e Elisa

Formigas

Sentado no vaso contemplava as formigas a meus pés
pequenas e menores que o negro. pontos fugidios que escapam à atenção
seguem seus carreiros e dão dois beijos repicados se se cruzam
em caminhos opostos e logo vem uma por trás que as empurra
e uma outra fora da esquadria de azulejo volta-se por momentos
e grita que vai procurar outros despojos. Para cima e para baixo o espaço
cruzado bem rente à matéria o muro vertical que inverte o plano referencial
e desce aos infernos pelo mármore do chuveiro

Zé Chove

Vanitas

Uma perna de porco recém cortada sobre a mesa de mármore
terminava numa mão branca de senhora mirrada como uma pata
de galinha recolhida cravejada de anéis, rubis e brilhantes
e ouvia-se ao longe um cacarejar enregelado e triste
por entre a névoa gelada e o alumínio ecoante das arcas de refrigeração

Lúcio Ferro

Mementum

os risos de crianças no jardim
um arranque frigorífico, um bater de asas
o som do suspiro-tédio
um enjôo de melodia
um temor perante o desperdício
duma vida
um desejo súbito de descer um rio
perder o pé sentir na cara a chuva
sentir o ritmo do corpo a enregelar
e aspirar profundamente a eternidade
sem sair do sofá

André Istmo

Descorrimento Final

acordas no carro, através do volante o sol nasce
em teus olhos e carregas no acelerador em direcção
ao precipício, (prepúcio arregaçado carícias?)
é tão fácil ser estúpido deixar a última gota no pano
no vinho benvindo, (infindo, enfado?)
fotografo as filhas do vizinho
(um suspiro?)
um copo de água e bochecho, talvez puxe um escarro
caio pelo precipício e principio um novo percurso
regressivo, tropeço em todos os escolhos (do meu futuro?)
e engulo todos os momentos do meu passado que não cheguei
a viver e afogo-me num presente que não deveria (ter acabado?)

Filipe Elites

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...