2.7.08

Anthologia de Textículos #6 - Lautréamont, Saint-Exupéry, Echevarría

Cantos de Maldoror – Conde de Lautréamont

Ó polvo de olhar de ceda: tu cuja alma é inseparável da minha; tu, o mais belo dos habitantes do globo terrestre e que comandas um serralho de quatrocentas ventosas.

Ó velho oceano de vagas de cristal, (…) mal te vemos, passa um sopro prolongado de tristeza, tal um murmúrio da tua brisa suave, deixando inapagáveis traços na alma profundamente abalada, e invocas a lembrança dos teus amantes, sem que nem sempre nisso reparemos, e os rudes começos do homem, onde ele trava conhecimento com a dor que não mais o abandona. Eu te saúdo, velho oceano!


Cidadela - Saint-Exupéry

Exalavam baforadas mornas e como que empestadas. A ralé emergia destas profundidades esponjosas para se injuriar com uma voz gasta e sem cólera autêntica, à maneira de bolhas flácidas que rebentam regularmente à superfície dos pântanos.


Da Epistemologia [1ª lição] - Fernando Echevarría

Memória é o nome que, na sombra, damos
À sombra em que se oculta o repentino
Sem fim do nascimento, aonde estamos,
Embora a sombra esconda que o cumprimos.

E, de na sombra vermos, demoramos,
E vermos na demora advém destino
De perdermo-nos de onde ainda estamos,
Pensando a sombra como um outro sítio.

E, de um ao outro, haver uma viagem
É sombra ainda a invenção da hora
Em que se cumpre o sonho da passagem.

Mas, passando, é sombra só, embora,
De lentamente ver, se erija aragem
O repente sem fim que ver demora.

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