3.1.11
Formigas
Sentado no vaso contemplava as formigas a meus pés
pequenas e menores que o negro. pontos fugidios que escapam à atenção
seguem seus carreiros e dão dois beijos repicados se se cruzam
em caminhos opostos e logo vem uma por trás que as empurra
e uma outra fora da esquadria de azulejo volta-se por momentos
e grita que vai procurar outros despojos. Para cima e para baixo o espaço
cruzado bem rente à matéria o muro vertical que inverte o plano referencial
e desce aos infernos pelo mármore do chuveiro
Zé Chove
Vanitas
Uma perna de porco recém cortada sobre a mesa de mármore
terminava numa mão branca de senhora mirrada como uma pata
de galinha recolhida cravejada de anéis, rubis e brilhantes
e ouvia-se ao longe um cacarejar enregelado e triste
por entre a névoa gelada e o alumínio ecoante das arcas de refrigeração
Lúcio Ferro
Mementum
os risos de crianças no jardim
um arranque frigorífico, um bater de asas
o som do suspiro-tédio
um enjôo de melodia
um temor perante o desperdício
duma vida
um desejo súbito de descer um rio
perder o pé sentir na cara a chuva
sentir o ritmo do corpo a enregelar
e aspirar profundamente a eternidade
sem sair do sofá
André Istmo
Descorrimento Final
acordas no carro, através do volante o sol nasce
em teus olhos e carregas no acelerador em direcção
ao precipício, (prepúcio arregaçado carícias?)
é tão fácil ser estúpido deixar a última gota no pano
no vinho benvindo, (infindo, enfado?)
fotografo as filhas do vizinho
(um suspiro?)
um copo de água e bochecho, talvez puxe um escarro
caio pelo precipício e principio um novo percurso
regressivo, tropeço em todos os escolhos (do meu futuro?)
e engulo todos os momentos do meu passado que não cheguei
a viver e afogo-me num presente que não deveria (ter acabado?)
Filipe Elites
15.12.10
Sepultados no Jardim das Traseiras 4
Enchofre Alcachofra
O Verão impiedoso sangra da sua jarra
imperial sobre os adolescentes
que vagueiam no bazar
o teu cabelo e o vestido são um só
sabes que azedam as memórias se expostas ao ar
guardadas em cave fresca constroem história
"e um povo talhado no profundo silhar"
Um mosquito no olho pode ser dos diabos
Baixinha, sobrancelhas finas e compenetradas e olhos profundos como a carne das ameixas. Não que os tivesse visto frente-a-frente mas assim os imaginava.
Desenho a posição das paredes que hão de ser a casa com um prego na terra seca.
Os talheres dançam esquecidos no lava-loiça
Todos esqueceram a sua função e dançam
Mãos a cheirar a marisc’alheio
**
PS - Não fiquem só a olhar um dia ainda quero ganhar dinheiro com esta merda.
Pisco Sawyer
Sepultados no Jardim das Traseiras 3
Alces grosses
Frazes noces
Amorfo espinhudo longo
Distinto pesa sobre a paisagem
Regressão após regressão somada
O atraso da pessoa, do animal
A inversão da marcha
Estagnada
O ensoleiramento que nos arraiga que nos assenta
___
Pisco Sawyer
Sepultados no Jardim das Traseiras 2
Durante a procissão o teu olhar é arrastado pela rola esvoaçante ou pelo cão maltrapilho e enquanto bates no peito reverberam na memória as ondas dum Verão passado.
Pisco Sawyer
Sepultados no Jardim das Traseiras 1
Foi uma noite de vivos
Aquela em que me dei à luz
No último quarto da torre da Isolação
Dois funcionários aguardavam à porta
O meu velho eu desceu ensanguentado
A cascata de água que todo o ano
Escalavrava a empena da torre.
Nasci São numa sala de sal e sangue.
Fui atormentado pelo meu velho eu
Durante a infância, visitava-me durante
A noite e nas tardes de delírio de Verão
Pisco Sawyer
Chorão em espanhol - Dos Lírios
"Sólo se vuelve uno realmente lírico tras un profundo trastorno
orgánico. El lirismo accidental procede de causas exteriores y desaparece
con ellos. Sin una pizca de locura el lirismo es imposible. Resulta
significativo que las psicosis se caractericen en su comienzo por una fase
lírica en la que las barreras y los obstáculos se vienen abajo para dar paso a
una ebriedad interior de una pasmosa fecundidad. Así se explica la
productividad poética de las psicosis nacientes".
Cioran
25.11.10
Retábulos
Somos o retábulo por demais macerado
Dos roxos nacarados do veludo mais ráfio
Perdem-se os passos nos ecos secos
Do canteiro mal assente e sem pedra de fecho
Oh oráculo sem sentido que nos arrebatas
Ao fundo dum poço ao centro do pátio
Em-nós, onde nos afogamos paladinos sem Senhor
André Istmo
Panorama Tropical
Matizo o panorama tropical em calda de álcool
A água de côco tinge a essência da praia num excesso de acidente
O homem sem perna postado junto da lâmina alumínica
Dum contentor de ar condicionado
Não fomos concebidos para suportar tanto e tanto se nos desfia
Entremos numa loja cheia de estilo e dispamos o chifon e as calças de ganga subamos no Leblon e recuemos no tempo morro à baixo
Todas as tardes nos sobrevoa uma migração de gabiotas negras
70 qualidades de cachaça a destilar no ventre
Isso aí é scroto meu irmão
Sor Flamengo
Vida Sub-solar
Eu moro na cave e os meus lençóis estão sempre molhados
Oh húmidos sonhos em que resvalo
Oh fresco pijama em que me embalo
As escadas que sobem em direcção à luz cheiram a mofo e a velho
Por isso adormeço agarrado à liquefação do tempo
Oh podre tédio
Quem me dera ter um piano que soltasse notas ensopadas…
O suor que ramifica nas toalhas e em vão chora sobre a pele
E um chulé humido que eternamente se desprende das paredes
Zé Chove
Cairapariguinhas
Perdidos na enclausurada praia do intenso açafrão o calor da caipirinha e da alegria garrida as garota deitadas apoiadas nos cotovelos o sol que as absorve o sonho tão seu tão pequeno tão único tão seu deus
Sor Flamengo
8.11.10
Do Frio da Noite
Musica de câmara e luz amarela
Cânfora e jarras de fina argila secando
Ao pôr do sol torrado
E uma vontade enorme de jantar
Na entrada da minha gruta com vista sobre o vale
Eremita
Cá de cima
A elevação do eremita
Do frio da noite quando cai
Do pardacento da paz sobre os silvedos
A solidão que invade com sombras os rochedos
O canto indefinido do amor inatendido
Tomás Manso
Diário Aguirre
Tive uns cálculos intestinais. Não o mero cálculo renal de 3 ou 4mm, um calhau de 6 cm que me fez sangrar durante 3 meses. Abusei da jaca. Em plena amazónia é difícil controlar os apetites. Chorei, chorei como uma criança e os guinchos dos micos e as garatujas dos tucanos troçavam de mim. Enrolava os punhos em lianas como o santo atado ao mastro da gávea e esvaía-me…
Sor Flamengo
Bezana Tolkianna
Kriterion krikeriot gremerion
frakterious charkmetkrem surbragdmidel
Trubdaumgartetiff
Schleiderborgen
Firtelvorfunfsich
Sabeltrouter
Folkenstruddel
Trapobanas
Calcitrundeim
Inveja
Tenho inveja desses prazeres de que não participei
Gulodices, tainas, o vinho espumando gargantas fora,
Todas as mulheres dos meus amigos, os deuses que não conheci,
E o prazer de percorrer o mundo como um relâmpago
Nicolau Divan
Agulha e Cordão Grosso
Sussurra com soltura o mote é sutura
Vê-a multiplicada bem fina
A sutura nos braços nas pernas nas paredes
Sinal lavrado da luta horizontal fonte
Escura sutura lance vertical de sangue
Segura garante do passado rego seco da cozedura
Sutura indelével no tempo perdura que rasga
Lancetada de puro álcool dor mal esquecida
Sutura
Orlando Tango
Maconha
Irmanados por um semestre
De loucuras, polvilhos de sono
Inanismo, desregulo e paixões
Partilhamos o mesmo tegúrio
A hipnótica lava lamp
O embalo da dança com a falta
De vontade de maconha torpe
De barriga roçando os céus
Atentos aos movimentos do candeeiro
Do mundo as cores os sons sem futuro
Sor Flamengo
Cartilha Maternal
Tem que ser um bocado cabrão. Algo que desperte. Uns clips pornográficos.
Uma provocação dos instalados. Um safanão na filha do colega.
Uma javardice com as crenças dos pacíficos. Uma granada deitada ao lago dos patos.
Ou diria, ou melhor falaria, ou passaria eu por um outro sistema de ver a realidade.
Encarno? Primeiro descarno. Dobro. Rasgo. E fodo.
E alivío oh se alivío!
Que o cadáver já boia no rio. Tingindo as margens dos humores de putrefação. Tingindo as margens onde as pobres mulheres entre os canaviais lavam as camisas dos maridos…
Filipe Elites
4.11.10
Saudades I
Fodasse que saudades
Que soco no peito quando vi a tua imagem
Esquecida num folder perdido na confusão
Um tom melancólico nos ouvidos
E a palavra saudade verta
Acendeu-se o peito num choro
Tão lusitano aqui perdido no rio de Janeiro
E o corpo pede clemência e corta a posta
De coração que fica em cima da mesa
Aqui estou eu ao alto de santa Teresa
E as lágrimas atropelam-se até guanabara e
Em vão tento esquecer o teu rosto
E oiço as línguas todas do mundo num sufoco
Brincam teus gestos no meu peito
A suavidade do teu encosto
Perco o tino na presença do teu…
E o sono seco por onde lavram as memórias
Agigantadas pela falta de juízo
Oh doces momentos que me choro
Tento em vão dispersar-me numa vida de fogo
Para que o frio da melancolia não me afogue
Ai o mar em que divago. Oh aventura que às vezes
Tão em vão pareces, em que embarco
À busca do que sempre tenho
Em busca do que já esteve ao meu lado
!!!!
Credo não posso ver tuas fotos que desfaleço!
Zé Chove
Saudades II
Oh melancolia parva
Mas quem me manda a mim ficar
A escrever até tão tarde.
Um dia as crianças vão se rir da saudade
Quando o vôo intercontinental barato
For institucionalizado
E vento que dá por trás das costas ao final da tarde
É como um soluço desprendido sobre a cidade
Um lamento que pinga pelos varais e pelo telhado
Zé Chove
Samba Primeiro
Não espera
Não espera pelo carnaval
Para cometer essa vileza
Não se você já tem a certeza
Pelas ladeiras
Descendo santa Teresa
Me Pega
Vem por trás me faz uma surpresa
Ai mas se você se atrasa
Oh e me deixa neste transe. Neste Espera…
Vamos trocar um passo de samba
Ao final da refeição na cozinha. Você dança?
Não espera o carnaval não espera
Mas se entretanto o Carnaval chegar
Eu pego o bloco e todos os meninos vou beijar!!!
Sor Flamengo
Pilar do Zé
A divinização do próximo
Com a consolação temporária
Duma divinização dos nossos acidentes
Por parte dum-outro
Ou a divinização dissimulada,
Mútua como objectivo de vida
Materialista e regalada
Lúcio Ferro
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