13.7.10

Mareado V

Lebanon blonde - Criatura angelical a vagueando entre rastafaris na praça do Adamastor com o mar e o rio todos metidos num só olho.

Esmerava-se por embrenhar os inícios das peças num limbo pseudo-intelectual, era a sua forma de vencer o mundo e de tirar um sabor mais doce do seu trabalho. Posso não ser actor mas hão-de reparar em mim e eu dominá-los-ei com um olhar condescente - consolava-se no duche todas as manhãs frias da sua vida. Passeava junto à praia todas as madrugadas e desabafava no mar.

Não há nada para contar?
É só isto que me interessa. É só isto que se me oferece. Um plano contínuo e largo profundamente cinemático às escuras pelo mundo em que flashes duma luz todo-poderosa vão gravando como diapositivos ambientes ou cenários na minha sensível memória. A história nunca foi contínua porque a nossa percepção é espasmódica.
O antigo cilo da Cova da Piedade ao lado da ETAR que fica nas traseiras da Lisnave confinando com o Alfeite está empestado de vampiros romenos. Esgueiram-se lá para dentro por um portão metálico dobrado no canto rente ao chão. Sanfonam a noite toda e ao final da tarde roubam todo o metal que possam encontrar: caixas de anzóis enferrujados, baloiços dos parques infantis, jantes de pick-ups, maquinaria dos estaleiros, cobre dos cabos eléctricos, sinais de trânsito... O saque é armazenado na Quinta da Arealva no Ginjal numa cova entre blocos areníticos caídos da falésia fóssil.

"No Sanatório do Outão durante o século XIX foi um reformatório de meninas. O único feriado que tinham era no solestício de Inverno. Nessa noite costumavam bailar com os militares do forte de São Sebastião situado uns passos abaixo. A fortaleza de São Sebastião fica em frente da Torre de Belém e as duas fortalezas guardavam a entrada do Tejo".
“As Paixões tornam-te diferente”, lia-se, era a dedicatória do livro. As folhas ainda estavam coladas sinal do interesse que os habitantes da casa tinham pelo livro.

Oh Leirosa de praias esquecidas e orgulhosas fábricas de papel escreveste a tua história na areia sobre a memória dos eucaliptais líquidos.
Quando o nosso carro por ti passava com os seus faróis prescrutadores só divisávamos a primeira fileira de eucaliptos que se recortava dum cenário de escuridão como uma fronteira para uma realidade alternativa.

Tomás Manso

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