Tinha esculpido na cara um sorriso de
felicidade esfuziante. Piscava com serenidade os olhos por segundos e quando os
abria parecia que descobrira novas maravilhas no mundo. Um sorriso assim
rasgado cada segundo da existência devia ser exaustivo. Com as bochechas
arrepanhadas para trás parecia ainda mais bicudo o seu afilado nariz. Era
barrigudo de pernas magras e estendia com prazer a quem passasse nos corredores
a sua mão espalmada e suave. A pele das suas mãos era suave como uma criança
embora já fizesse a barba todos os dias. Demorava-se nos cumprimentos num
crescendo de alegria nervosa. Mas onde habitava tão fascinante criatura? Era
dono de uma padaria em Maringá MG que também vendia lenha e acessórios para as
lareiras, espigões de aço para ajeitar as brasas, tenaz metálica, fósforos
compridos, bufadeiras, pastilhas de resina, vassoureta ,pá metálica e outras
traquitandas supérfluas para os obcecados na arte. Também vendia lápis e blocos
que ele mesmo usava para fazer a gestão do estabelecimento. Era metódico com as
contas que garatujava com a sua mão suave envolvendo o lápis como uma aranha.
Tinha nojo de tocar nos cêpos com as suas delicadas mãos. Tinha pesadelos
quando cochilava depois de almoço na penumbra da loja com os líquenes e musgo e
as cascas cheias de crateras misteriosas das árvores, imaginava as aranhas,
lacraias e centopeias vermelhas que se escondem na humidade mais escondida dos
velhos troncos e adivinhava espíritos e criaturas maléficas escondidos nos
veios das árvores libertos fugindo com chiares e estalos no fogo das lareiras
assombrando os casebres pobres da região e espalhando a maldade pelas chaminés
e escondendo-se de novo nos topos frios das montanhas e descendo uivantes no
caudal das cachoeiras do rio Preto! Acordava sobresaltado e penteava o cabelo
oleoso e a barriga. Vivia num pequeno chalé nas traseiras da venda que olhava o
rumorejar incessante do rio. Em 66, um ano antes de terminadas as obras finais
da igreja de Maromba, uma tempestade fulminou a região. Os rios galoparam
desenfreados com vontade de destruir. Na bonança floresceram as lendas como a
do menino Moisés encontrado entre as lamas depois do dilúvio. Tive oportunidade
de conhecer o Moisés, um homem feliz, conhecido pelo seu fusca-taxi branco de
80 e pelo seu restaurante onde a especialidade é a truta. Ele mesmo tira a
espinha das trutas na travessa do cliente num gesto de paternidade bíblica. O
Brasil ainda está cheio destas lendas e mitos perdidos nos recônditos da
floresta.
Uma população extremamente religiosa foi
morar para Maromba em roças e pequenas fazendas. O que as levou a carregarem as
trouxas, burros e mulheres até aquelas altitudes? Hoje em dia toda a gente
trabalha para o turismo. Cachoeiras, vegetação e um clima peculiar atraem
hordas de brasileiros em busca de romances tórridos no meio do frio
transalpino. Os nababos no boteco mais seboso da praça central
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