14.8.15

RADIO

Volto a casa depois deum dia de trabalho no Rio. É feriado em Niterói e as ruas estão desertas. Os ventos correm na Amaral Peixoto e sinto-me ridículo. Só eu tenho emprego nesta cidade? Os vagabundos sumiram das praças que parecem maiores sem pessoas. As chuvas arrastam tudo o que é mole. A cidade fica dura e brilhante nem que seja só por uma noite. Subo o morro desejando ter abertura para que mais pensamentos e sonhos escorressem pela memória. Até nisso somos limitados. Não comportamos mais que 2 ou 3 imagem em malabarismo mental. Num setor pensava em Artur, Merlim e na Inglaterra pré cristã, no outro setor equilibrava um desanimo pessoal por não concretizar nada, noutro vórtice negro pairava a sombra das dívidas e via o sorriso negro de múltiplos credores e a dependência de trabalhar para patrões malvados, tentava empapar tudo num ritmo tipo doors – killer on the Road, de facto chovia como na música, a alegria de ter uma família rasgava-me um sorriso na cara, no centro do peito tentava compreender a angústia dos deportados para os gulags. Riders on the storm. O Nick Cave dizia que escrevia como um espectador atirando para um palco imaginário personagem antagônicos e esperava que interagissem. Dificilmente o antagonismo vem empapado de amor. Existem versões do The Wasp (Texas Radio)  em que se entendem melhor as palavras do shaman. Penso nas cidades irmãs: Niterói, Almada e as cidades dos pântanos da América negra é um amalgamado de soul, repressão, negritude e lama que nunca seca. Funk, Alligators canoando pelos canais da seca do bacalhau nas imediações da praia da luz onde escovam o casco dos navios, porta de entrada de drogas leves e berço de raivas por chegar sempre em segundo lugar e por ter méritos concedidos por complacência das cidades maiores das vizinhanças. Subo o morro em paralelepípedos de basalto talvez trazidos dos açores ou serão de gnaisse? 

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