4.4.08

Lamentos Cegos

Diz o cego do metro:
“É mais fácil encontrar uma beata
No chão que alguém me dê um cigarro”

Nem quem o grão semeou
Do grão há-de comer
Não tem dó
A vida sob uma mó

Não quero aprender
Só quero certificações
Diplomas, certificados de habilitações

Muito devia ser muinto
E 13 treuze

Todos deviam dizer molhos
Da mesma forma
E não fôrma
Molhos e molhos
De ideias marejadas
Nos meus olhos
Como argueiros empilhados
Ao longo dos séculos
Dêem me um cigarro

Tum pe te pumpumtchim
Tum pe te pumpumtchim

António arribou ao escritório
Com estrépito e atónito

Esvaíra-se o lago de calma
Espelhado nos olhos da sua alma

Como me sinto só
Tentei restabelecer o diálogo
Com todos os meus empregados

O que é o Ultramar?
(envie-me pdf’s e ebooks sobre o tema)

Brilimpimpimtipipimtrim
Gaita-de-beiços na vara
- Oh meu Deus quem virá salvar
os nossos cegos? –
Todos os povos têm seus milagres
O milagre do pensamento
O milagre da guerra
O milagre do comércio
Das artes, do desporto, do silêncio
Foi da dinâmica dos astros?
Multiplicidade de impulsos interiores?
Fortes amizades ou um forte estado?

Brócópótrópóp´popótróc pim
Caixa das moedas e varão central

Cada vez que te dobras
E perdes raio de visão
O estado investe e explora
O teu bem amado quinhão

Filipe Elites

Mau Dormir

Sou o que mais sofre e ainda
me incitam a pagar a rodada
olho desconsolado na cerveja
uma mosca morta a boiar
só se está bem na cama

Acordo mole no escritório
com medo que o patrão
veja esta bagunça e lhe
chegue ao nariz o cheiro
a ropa e carne estufada

de olhos embotados como
batatas, vagueio secretárias
durmo sempre em agonia
com ideia de ser apanhado
de pijama por um funcionário

De novo o acne do adolescente
De novo mau génio e raiva impudente
De novo os sonhos grandiosos
De novo os serões ociosos
De novo na cama deitado

A música é foleira – não contesto
Mas atiça-mo sentimento
Não faço grandes considerações
Já estou deitado na cama

Alguns poemas ficam espinhados
Quando vagueio na cama já deitado
Dos riscos de contar as sílabas
Parece que brilham, parecem cactos
Secando nas dunas do deserto

Marco Íris

30.3.08

Typhoon Krosa 7 Out. 2007

Archivo de imagens #28

Tinha Tinha

A falha
Que tinha
Na cara
Não era
De Sarna
Era tinha

Mas já não
Há falha
Na minha
Carne
Foi extinta

E a falha
Sem barba
Na minha
Cara
Que não
Era Sarna
Mas Tinha
Já pica
De barba
Cheiinha

Paulo Ovo

27.3.08

Romance Grotesco

No meu dicionário mental
Associo à palavra grotesco
A sua cara de cavalo.

De olhos fechados vagueio
Através da matina de ar fresco
Tremendo pela rua com anseio.

Transpor tão desgraçada cancela
Foi impulso quixotesco
Em busca de tão feia donzela.

Aterrorizada a grande mula zurrou
Mal vislumbrou meu jeito simiesco
De pernas tortas e capote de grou.

De damas é que eu não pesco
Terminou mal começou
Meu romance pitoresco.

Diniz Giz

Curses, Invocations


Caudinha de Marmota

Bigode Chinês

Bola de Naftalina Húmida

Catotas Despenteadas

Barca Rota

Hálito de Burra

Mija de Osga

Casaca do Cigano

Ceroula de Velha

Tíbia de Macaco Idoso

Céu da Boca Inquinado

Bafo de Ostra


POPULAR

Oferta de Emprego

Pela matina atravessava o Chiado,
Os loucos já sentados nos seus postos,
Algum trabalhadores nocturnos voltavam a casa,
E os alegres a vagabundearem bêbados.

Eu não queria, mas ia trabalhar,
Preferia ser louco e coçar as costas no Adamastor,
Pedir bolos grátis nos cafés,
Ou ficar sentado na boca do metro a ver as inglesas.

Andava contrafeito pró trabalho,
Preferia ir já cansado da faina nocturna,
Curtindo a madrugada fresca,
Embalado no cacilheiro para um sono diurno.

Olhei com rancor a porta do escritório,
E desejei a leveza do ébrio,
Quis gritar sem consciência dos meus actos,
Flutuar de bar em bar sem memória dos dias.

Cumprimentei com vivacidade o porteiro,
Sentei-me na secretária concentrado,
Liguei o computador com cara alegre,
E trabalhei com o afinco habitual.

Zé Chove

22.3.08

Sheboygan Lighthouse Storm Wave

Archivo de imagens #27

Quadras Açoreanas

O vento uiva
de culpa
à noite
nas grutas.

Eu te asseguro
filho meu
não é bom auguro
se chora o breu.

O mar ruge
é monstro imenso
imensidão sem luz
cemitério imenso

se por feitiço
ou encantação
se por enguiço
ou tentação

teu corpo flutuar
quiser perdido
entre as ondas do mar.
não lhe dês ouvidos.

Faz-te mouco
e desentendido
que só um louco
não vê o perigo

O choro que escutas
não é humano
lá entre as grutas
do mar insano

é o sono profundo
do Leviatã
Respira fundo
Aguarda pla manhã

Mário Mosca

TS Eliot

A música da poesia não é coisa que
exista separada do seu significado.
É claro que poesia alguma corresponde
exactamente à linguagem que o poeta fala e ouve;
mas ela deve manter uma relação com
a maneira de falar da sua época.
A música da poesia deve, portanto,
ser uma música latente na fala quotidiana
do seu tempo.

No Totem

No Totem a tasca mais carente do distrito
sentados já sem assuntos
quando as horas são mais lentas
enregelando sob o avançado de alumínio
meditávamos no bando de carniceiros
escondidos entre os pinheiros
que envolvem a região
que atacam e matam
por meia dúzia de presuntos
esfaqueiam e esquartejam
sem lógica aparente.
Temos medo de ir dormir
pelo menos aqui
morreremos todos juntos.

Orlando Tango

A Morte do Reino

Neste trono de carne
entre almofadas de carne
envolto em solidão
bebendo o silêncio
estabeleço a ordem neste mundo
só dependo deste cordão
do universo eu sou o centro
mas quem me afogou neste lago profundo?
Ai sinto agora puxarem-me os ossos
Adeus oh Reino Amniótico!

Lúcio Ferro

Lenga-lenga das vogais

Nem imaginas a Paz
que dá
não ter um segredo
se quer
a esconder ou encobrir
amigo.
Ter alma de forte rocha
exposta
que o vento em vão empurra
- Segura!

Maria Vouga

19.3.08

Novos Ditos Populares

Pá na terra,
espírito berra.
Cheiro a morte,
garra forte.
Cova aberta,
alma desperta.

Maria Vouga

Decadência Urbana

De noite perseguido no
escuro pelo marulhar indefinido
das avenidas.

Lembranças que passam sem
deixar rasto mas
sujam o fundo dos ouvidos até
à insensibilidade.

Dispersos arrabaldes que
fogem à cidade mãe e
dormem à noite,
cada vez mais longe, filhos
dispersos, até ganharem
independência lá ao
longe onde criam as
suas próprias histórias.

Do ar vê-se: escondem-se nas
matas fronteiriças.

Triste da alma arrombo o
primeiro chaço que encontro,
decompondo-se com
um murmúrio surdo debaixo
de um velho lampião intermitente.

Zé Chove

Família

Archivo de imagens #25

Selado

Selado com ferro em brasa,
No vácuo escuro das masmorras,
Retorcia-se mole e gordo,
O mais gigante demónio.

Flutuava no fogo líquido,
Esperava com calma através dos milénios,
Trincando o ar desejoso,
Do dia do Apocalipse.

Zé Chove

13.3.08

A Lua

A lua essa gorda rançosa

Não me larga

nem aos peçonhentos sapos

que nas valas húmidas acasalam

e nas ruas escuras da vila

ainda há luzes nas garagens

e dispersas ainda se ouvem

gargalhadas reflectidas nas chapas

de alumínio das fachadas


mas o grosso é silêncio

evolado dos becos e baldios


não sei o que espero

nada me dizem os meus passos

não sei o que quero


Quem me guia é a lua

essa gorda rançosa

que não me larga



Filipe Elites

Fio Dental

Ficava sempre alarmado

quando o tio cagava sangue.

“Será que vai morrer?”

Como a alma o sangue não

deve ser perdido é

vital.

“O sangue é vida”

pensava.

E agora que perde litros

e litros ao lavar

os dentes

sente

C'o tio deveria usar

fio dental entre as nalgas.



Zé Chove

Switzerland, 1900

Archivo de imagens #24

27.2.08

Monte dos Vendavais

Conquistaste mais um forte,
da minha fraca vontade.
Amor sincero, afável,
todo teu te entrego.

Abafo o teu corpo descoberto,
solto a sombra do meu desejo,
cubro a brancura pura da tua face,
de imundos beijos negros.

Faca dilacera o teu peito,
sangue fluido imundo misturado,
no podre cancro do meu seio.

Na palidez enferma da tua pele,
surge o vergão vermelho infamante,
sou mau toquei-te de morte.


Diniz Giz

Paixão Exótica

Cães ladram na pradaria,
anciãos entoam lamúrios milenares,
no alto de minaretes na escuridão,
as estrelas chamam por ti.
A tempestade do deserto dança,
sou levado pelas dunas.
As formas da areia lembram o teu rosto.
guitarras ciganas fogem na estepe,
fogueiras derretem a neve,
pandeiretas imitam o ritmo do teu coração.
Nos altos penhascos de granito,
riachos frescos soltam neblinas,
e no meio de castelos em ruinas,
ecoa o teu nome nas colinas.

Carlos Marques

20.2.08

One Word More

Rafael made a century of sonnets,
Made and wrote them in a certain volume
Dinted with the silver-pointed pencil
Else he only used to draw Madonnas:


These, the world might view – but one, the volume.
Who that one, you ask? Your heart instructs you...
You and I would rather read that volume...
Would we not? That wonder at Madonnas...


Dante once prepared to paint an angel:
Whom to please? You whisper «Beatrice»...
You and I would rather see that angel,
Painted by the tenderness of Dante,
Would we not? - than read a fresh Inferno.


Browning

15.2.08

Serviço D

Serviço D
senha 31
mesa 2

trucum, trucum, trucum

"Estou aqui para dar resposta notificação"
__________Baby, can I hold you ton...
"sente-se, sente-se"
truc, truc, truc

Open space ortogonalizado ao meio
com cabinets vermelhos
escondidos
milhões de cabos
no falso tecto e no falso
chão

tiruli, tiruli
:::::::::::chuk, chuk,chuk

"si,si,sim, eu sei que você..."
protocolo 1058 - "Já analisámos a sua situação"

Serviço B
senha 12
mesa 3
Através de janelões modernos
a calma do jardim
vetrx
carregado de sinais
tou,tou,sim
dum estado novo - "Lucinda, da minha parte tá
tudo ok!"
troctroctroc
________vvvvtrusch lick

"Desculpe... podaguardarnasala?"
tiruliruliruli
"Já o chamamos"
flopfloskflop
___-Já enviamos à DARPAL?
huuum quistá seu comprovativo"
block.block.block
Zé? Zé? Não estou a conseguir aceder ao sistema..
CONTINENTE - ONTEM ORGIIIA AMANHÃ! (cantado)
flap,falp,flap
a cloud of sounds
souttxtx my brain
from ear to earliililil
"pois, agora tem de aguardar..."
@160 BPM
Talvez problema na base de dados
Garrafinhas com água
Já ligaste pró Back...


Orlando Tango

A Arca

A Arca,
de Aarão o bastão,
o maná,
e as tábuas da lei.
De prata,
e ouro os querubins.
E Deus,
cheio de misericórdia,
de pés
sobre o propiciatório.

A Arca
têm-na os etíopes
de éfode
vibram como David

Oh Arca!
és tu minha mãe?
A Lei
derrama-me no coração.
O Bastão
Abre-me o caminho seguro.
O Maná
que me encha de força.


Madalena Nova

Torre em Ruínas entre Rasteiro Matagal

"Desculpe lá... Vendem passarinhos?"
"Oh'mem pens' qu'a'gora 'tá d'fícil d'encontrar?"

____Os pesitos gordos forçando
____As sabrinas douradas
____quero morder-te aí mesmo
____Nesse bifinho transbordante

Filipe Elites

Poesia Popular Protuguesa

Nem imaginas a paz
que dá
não ter um segredo
se quer
não gruta bafienta,
cinzenta,
ser rochedo exposto
ao sol
e à tormenta

Maria Vouga

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...