6.5.12
Relação Satélite
O planeta está de cuecas
exalando um odor de final
de fim de semana sem banho
não está barbeado o mundo
e a lua reclama
com o glamour duma dama
que se enfurece com o homem
que tarda em sair da cama
é um mundo à beira do divórcio
é um mundo mergulhado no ócio
André Istmo
Um Dois Crack Samba Alucinado
vou largar minha casa
não vou voltar nunca mais
um dois crack
vou partir para nunca mais voltar
minha laje na favela
minha chapa no meio da rua
meu cantinho sob a ponte
eu vou queimar meus laços
de Mangueira à Guanabara
o que me pagam para exaltar?
ponho meus versos à vossa disposição
é uma arte comprada à quem diga adulterada
venham escolas de samba
venham síndicos ou palhaços da Grobo
estou aqui se você quiser comprar
uns versos sentidos sobre o vosso bairro
ou sobre a vossa cidade
adivinho o que a opinião pública quer
é a sacanagem, politiquice e papo de mulher
é o futebol, religião polémica e artista da tV
é do clima e dos favelado é a desgraça alheia
de tudo isso eu falo
de lágrimas nos olhos
e solto um sorriso bacana
se voceis me der sua grana
O samba voou
abriram a janela
da sala da casa
de tijolo
no alto do morro
o samba voou
O samba desceu o morro
e a cada curva chiava a cuíca
cada baixo é um passo dançado
e a guitarra é o sol lá no alto
Nem Mar
Piropos Tropicais
meu bem
minha babe
meu bêbê
minha maravilha
minha linda
mulher do meu carinho
você me deixa perplexo
você me deixa perturbado
você arrepia meu caminho
você me deixa aluado
mãe dágua do meu amor
represa do meu sentimento
na alta montanha
onde degela meu coração de pedra
em cascata risonhas
se despenha o meu amor
vou te pôr no carrinho das compra
vou te levar ao preço do filé bovino
vou te embalar junto com chouriço
e é só te procurar na geladeira
sempre que eu te quiser comer
fresquinha como folha de alface
docinha como uvas acabadas de colher
tu és o alimento da minha vida
tu és meu arroz com feijão e farofa
e se sentir de madrugada uma sede
irreprimível sede de Verão
vou te buscar de pijama
e como leite ou suco de ti eu vou beber
Nem Mar
Delírio Sazonal
Arlindo cruz, zeca pagodinho hey
chico buarque, beth carvalho
eu vivo entre génios
meus altares a caimi e a gilberto
espírito de adoniran e jamelão
um banho frio em copacabana
em queda livre do pão de açúcar
todas as favelas crescem
os génios desaparecem
e as favelas crescem
a corrupção queima
arde na tatuagem da menina da barra
vigía do alto do cristo
como um urubu nada me escapa
toda a podridão escorrega até a guanabara
todo o caveirão dispara se a noite tarda
São as visões do portuga
são delírios do portuga
as miragens do lusitano
a palavras do manel e joaquim
este é o país do futuro
estão cheios da grana
este país continental
dos santos no inverno e o natal no Verão
Sôr Flamengo
5.5.12
Novela
Algum dia viria a conversinha
do costume sobre o amor exigência
dos sambas que eu sempre tentei evitar
aqui vão algumas ideias
insensato coração das 9 às 10
telejornal algures durante a janta
Casa da rosa no domingo ela sai com as amigas
um suquinho de acerola no leblon
apartamento na barra ela é barra
um passeio no barco do eike
café del mar no sábado
meninos de peito depilado
e buço loirinho
corpo sarado e vestido curtinho
morena, ruiva, loira ou marron
depende da estação do ano
Sor Flamengo
lascas
a tirania dos apetites descontrolados
confunde o entendimento
comprime a vontade
afunila as decisões
o amor destrói os tiranos de coração
insensatos, loucos, mentes fragilizadas
mentecaptos, desviados, estultos
Medos e Mares
Até me tremo todo
de pensar entrar no mar
e ser recebido com frieza
recebido num abraço gelado
e sentir-me na sua ferocidade
um filho pródigo
nunca de mim estar certo
e que o seu julgar sobre mim venha
como ondas do pacífico louco
que medo hei de eu ter da morte
é um transe dum segundo
uma faca destrinça-me a medúla
como o vento quebra um mastro
Orlando Tango
Rádio Macau remix
E o tempo é rei
um fado sustenido
é bemol assim
um suspiro surdo
do bombo escondido
um sambastante conhecido
é uma melodia
é um amigo
que te tenta todo o dia
e depois se deita ao teu lado
toda a noite endiabrado
Xutos remix
Bestas que te esmagam
fonte gelada ao centro a praça
água que te corta
vento que esfrangalha
dormes no passeio
dormes na estrada
as casas desertas
desertas as igrejas
gritas aos céus
e caem as folhas
despem-se as árvores
e os ribeiros correm indiferentes
mudos cunhais silenciosas cantarias
não és o vento
não és as cortinas
rangem os soalhos
à tua passagem
gemem nos ninhos
as palhas secas
almas estanhadas
ressacas de lama
farpas nos dedos
serras nos pulmões
lançam-se os penhascos
em quedas cegas
mergulhos de granito
embates no infinito
afagas a chegada
e esqueces o princípio
lanças te espada
esgasgam-se as poças
no sufoco de tanta solidão
Filipe Elites
rimas em A
a noite é um lago de diferentes profundidades
fundos negros, azuis e verdes nascidos dos laranjais do fim da tarde
são sobrancelhas as copas negras das árvores
os céus olhos que falam com brilhos sódicos da cidade
Madalena Nova
Mediterrâneo
Todas as desgraças do mundo foram à beira do mediterrâneo
todo o sangue escorreu pelas suas pernas
os danados frémitos de dor marcando o compasso
as guerras como os grãos da areia daquela praia imensa
todo o mediterrâneo de azeite escorrendo dos olhos
os templos ecoando o latim subjugado como uma bota
negra esmagando a boca da criança
e as vozes iradas entoando como um hino de justiça
"esmaga, queremos as suas vísceras mornas arrastadas pela terra"
e eles coitadinhos, de olhos piscos sob a ventania do crepúsculo
santos e mártires escondidos na sombra de cada oliveira
latim, latim, latim berra uma cabra a uma cadela assanhada
e das calmas vagas do mar morto ao centro do mundo
como uma arena dum coliseu exala um miasma
um cheiro a merda mas ninguém repara
Brás
Perdas de Altitude
É isto que acontece quando se perdem as leis do hermetismo
quando abandonamos os caminhos da razão e passamos a conviver
com os leões e os outros animais da selva
perdemos da memória os passos do convento agora tomado pela era e pelo vento
os poços transbordam agora de selvagem imundície
e os muros ufanam-se de flores garridas de perfume brejeiro
perdemos até a ordem dos dias
vagueamos até altas horas pelas serranias fantasiando
na voluptuosidade das constelações saboreando as agruras simples
como o sangramento e o frio
caímos sem forças pelos monturos em covas húmidas
deixando-nos sepultar pelo tédio e a fraqueza
os vislumbres relampeados dos salões outrora cruzados
parecem-nos um sonho
e era daí que emanava a poesia
em borbotões uma fonte de sentidos
descritos numa linguagem que só nos perturba se
sobrevem a dor das perfeiçoes perdidas
Sim o meu nome é Cain
Sim o meu nome é Cain
Zé Chove
22.10.11
Vida a Dois
suas folhas sobre as minhas
secas mãos de outono
o fogo sobre a pedra da cozinha
o torpor dos anos foi um sono
a chaleira espalha as brasas
pela sombra do sobrolho um fulgor
de chuva no fundo da alma, os pratos
são memórias que escondo no aparador
as rendas brancas suspiram à noite
as estrelas atrás das vidraças
fervilham num continuo pensamento
A vida a dois é um resguardo no socalco
da escarposa serra, é uma cozinha quente
que ao final da tarde se encerra
Leonardo Cardo
secas mãos de outono
o fogo sobre a pedra da cozinha
o torpor dos anos foi um sono
a chaleira espalha as brasas
pela sombra do sobrolho um fulgor
de chuva no fundo da alma, os pratos
são memórias que escondo no aparador
as rendas brancas suspiram à noite
as estrelas atrás das vidraças
fervilham num continuo pensamento
A vida a dois é um resguardo no socalco
da escarposa serra, é uma cozinha quente
que ao final da tarde se encerra
Leonardo Cardo
No Dout
Procurava convencer em sonhos os teus
inimigos a que não te ferissem
e acabava por deles me irmanar
perplexo com qual verdade amar
por vezes a razão mais fria
sobrevinda por um caloroso diálogo
adenda-se de nebulosa dúvida
Alcatra Vecon
inimigos a que não te ferissem
e acabava por deles me irmanar
perplexo com qual verdade amar
por vezes a razão mais fria
sobrevinda por um caloroso diálogo
adenda-se de nebulosa dúvida
Alcatra Vecon
Para uma Gazela
Sonhei espaçadamente ao longo dos anos
como uma doença sazonal que volta
num misto de tristeza e melancolia
que ainda na mesma casa juntos viviamos
e o nosso conhecimento era mais profundo
aprendi a ler ao longe a intenção dos teus gestos
passei em sonhos a defender as tuas causas
e tu aceitavas a minha devoção
acordava por fim suado
numa rodilha de lençóis abandonado
com o olhar difuso no fundo do quarto
e uma ancestral noção de corte com uma vida
que ressecou ainda jovem como erva ao sol
como um corso que deixa escapar a sua gazela
pela floresta densa e brumosa da memória perdida
~~~~
Major Catete
como uma doença sazonal que volta
num misto de tristeza e melancolia
que ainda na mesma casa juntos viviamos
e o nosso conhecimento era mais profundo
aprendi a ler ao longe a intenção dos teus gestos
passei em sonhos a defender as tuas causas
e tu aceitavas a minha devoção
acordava por fim suado
numa rodilha de lençóis abandonado
com o olhar difuso no fundo do quarto
e uma ancestral noção de corte com uma vida
que ressecou ainda jovem como erva ao sol
como um corso que deixa escapar a sua gazela
pela floresta densa e brumosa da memória perdida
~~~~
Major Catete
Indecisão Querida
o leito das estradas ensopado
o asfalto de chuva e lampião
alaranjado clarão da noite
que vagueio às vezes em busca
Do que de dia jamais enxergo
e só o opaco bréu me revela
no silêncio de passos madrugadores
meus anseios, medos, humores
rumino até à ardência cerebral
evitando por entre as árvores
do caminho qualquer conclusão
apraz-me dançar na confusão
que a alma a dúvida me devore
e arvore a indecisão na alma
~~~~
Major Catete
o asfalto de chuva e lampião
alaranjado clarão da noite
que vagueio às vezes em busca
Do que de dia jamais enxergo
e só o opaco bréu me revela
no silêncio de passos madrugadores
meus anseios, medos, humores
rumino até à ardência cerebral
evitando por entre as árvores
do caminho qualquer conclusão
apraz-me dançar na confusão
que a alma a dúvida me devore
e arvore a indecisão na alma
~~~~
Major Catete
17.8.11
Eu Queria Morrer em Sesimbra
Eu queria morrer em Sesimbra
Cair em todos os tons de azul
Do mar gelado ao sol
Cair da mais alta escarpa
Sentir em minha a queda
A leveza do ar que não me carrega
E me afunda sem folgo
Num mergulho num afogo
Será apenas um segundo
Com os olhos muito abertos
A toda a beleza do mundo
Nos tons vermelhos da falésia
Zé Chove
Bossa Senses
Chia a cuíca
zumbe o besouro
fervilha ramada do coqueiro
o céu côr de rosa
o mar verde
e o ipê vermelho
cheiro de engrenagem
cruzado em aroma de asfalto
e aqueloutra fragrância de nívea
o toque acetinado do caju
e rugoso morro granítico
e o toque líquido da cachoeira
a acidez do limão
e o sal do mar nalgum sobrolho
e jovialidade do guaraná
Sôr Flamengo
11
Ressoou como um turbilhão mais longínquo que o eco
as ondas dum mar interior sem margens
revoaram em busca dum descanso eterno
numa praia que nunca viram numa morte que as receba
Radiografias + Silica
ossos nos ossos sobrepostos
na prata de radiografias velhas
cruzamos distraídos sintomas
num mar de cromossomas
silica
pó de quartzo
fino brônquio
ocupado
oco sólido
enquistado
bloco alvéolo
Éolo aspirado
Dr By Hard
Miomas +
Mio Màs...
Mio màs... non
Surgem-me negros no caminho
na sombra da ultrasonografia
como fantasmas benignos
que num mar esquecido
afogam alguns destinos
num silêncio de carne triste
por um filho que não existe
Sensibilidades vão se desgastando
Um calo enorme protege-nos da luz
O halo da consciência mais brando
descai sobre mim teu nevão
frio nem abrigo quero
Infernizas-mas hormonas
memorizo os teus miomas
engoles-mos problemas
envergo os teus emblemas
Dr By Hard
Sacolé
sacolé sacolé gelado
enche o saco
sacolé cheio de côco
dente, língua, raspa
chupa, soca, engole
sacolé de leite e côco
fibra e creme o doce
e o sublime um êmbolo
aspiro o teu fresco sopro
beijo de côco, maracujá,
limão, goiaba, côco, Côco
papilas agitadas de tanto molho
ácido, doce, amendoado
papilas aroma agitado
odor na língua mole
exótica natureza língua no saco
últimas gotas
melhores gotas
dentes que sulcam o resto do saco
delícia lábios de côco
hálito tropical
coalho nos recantos molhados
da boca fresca
gelado de fresa ou framboesa
sacolé que embrulhas a floresta
lábios vermelhos
Sôr Flamengo
Abraço Fraterno
pensava como sempre pensava
que fraterno é mais que fraternal
assim como tempo é mais que temporal
a diferença entre o ser e o modo
entre o que está na essência
e uma certa forma de agir
algo que permanece e faz parte.
sabendo que as nossas acções
podem esconder uma outra intenção
enviei-te um abraço fraterno
mais forte que fraternal,
ainda que só escrito já que
não cheguei a sentir o estreitar
dos teus ossos enormes,
na esperança de que sentisses
mais calor, pelo menos na minha intenção
André Istmo
Lágrimas
Pequena entre os cacos
pequena entre os cacos
de vidro no chão espalhados
os teus pés em sangue descalços
maldiz o teu querido pai
maldiz a família ai ai
quem te faz assim sofrer
as lágrimas que se quebram em vidro no chão
são lágrimas que se quebram em vidro no chão
lágrimas q'se quebram em vidro no chão
lágrima q'se quebra é vidro no chão
que fura o sangue ao pé descalço
que a tristeza atinge a pobreza
na parte de baixo
na parte de baixo
e dizem que lágrima de rico é arte
tão doce é mel falso que enjoa
quero daquele choro que magoa
de verdadeiro vidro que quando cai estoura
e se elevado ao céu o sol doura
é choro bom como um copo de cachaça
é choro de pobre que lua exalta
é choro de morro que povo gosta
Sôr Flamengo
Comércio Carioca
Compro ferro
compro metal
compro tralha
aluminio e louça
compro ferro
vendo arma
vendo droga
vendo mulhê
vendo goma
vendo bala
compro carne
compro carne
vendo alma
vendo a alma
Sôr Flamengo
Montada em Fuga
Tinha uma montada segura
mas uma noite perdi meu cavalo
fugiu minha sela segura
prós lados de São Gonçalo
Afrouxei na firmeza da rédea
perdi o controlo das decisões
rabiou minha confidente montada
agora sigo pelo caminho a pé
Era tão bom montá-la
o ritmo suave das nossas ancas
mas montadas velhas exigem firmeza
meu coração jovem só tem moleza
lá vai ela no alto da cordilheira
as aldrabas carregadas dos meus bens
desprezando orgulhosa o meu anseio
e eu aqui sem caminho e sem vintém
Sôr Flamengo
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