16.8.11

7


Fui mijar no prédio modernista e entre labirintos
de portas e janelas emparedadas perdi-me. Só consegui encontrar passagem
para a cobertura. Lá de cima via os meus pais e meus dois irmãos afastando-se
como se já me tivessem esquecido.
Nunca fui de pedir ajuda para nada ainda para mais tendo-me embrulhado eu próprio nesta cilada.
Via as pessoas lá em baixo a 4 pisos de distância e não me passava pela cabeça pedir ajuda.
sempre fui orgulhoso e se puder resolver as coisas sozinho melhor. não gosto que me vejam preocupado, não quero que pensem que me encontro atrapalhado ou perdido.

6


Os prédios são a fachada da manhã leitosa e parda
A escuridão é noite que sobre nós se abate
Uma cortada na outra com estilete de luz
os olhos abismados imersos em sonhos de alcaçuz

Perseverança, preserverança, preseveransa, preceveranza


Não desisto de escrever embora agora ande mais vigiado e tenha de ser mais vigilante.
Vou anotando as minhas raivas num bloco de notas do windows durante o expediente.
Acho que já podia ser um escritor consagrado se não fosse a porra da exigência de um trabalho que me sustente na dormida e na bebida.
Domínio das palavras não me falta. Originalidade e até um certo psicadelismo perturbam-me amiúde. E experiências chocantes estão guardadas na minha coleção de vhs.
custa-me concentrar o discurso numa só história, mas nos dias que correm o zapping é quase tão certo como pôr o pijama ao chegar a casa.
as pessoas andam baralhadas e não têm concentração suficiente para. alto chega de teorias. O amanhã apresenta-se granitoso. impenetrável e frio.
não tenho medo, apenas indiferença. Não tenho forças para me preocupar.
Como o escrevo se torna imune ao estalar do chicote, assim prossigo de cabeça erguida perante as burocracias que me assaltam como pássaros assassinos sem medo de preencher mal os dados relativos ao agregado familiar.

Manel Bisnaga

5


Amola-me o olhar minha rua
assola-me o caminhar de orvalho
em ordem geométrica dispersa
no vento bravo sul em buenos aires

Canaletto - Capriccio


Hip Hop no Morro



Os meninos esperavam-na mais que o natal
e ela não chegava a aparecer
como também as prendas para sempre adiadas
cadê o fuzil? cadê a granada? cadê minha mina
que nunca aparece no pedaço
eu rimo no vibrar da pipa
vibra meu coração como o vento na bandeira
é a bandeira do brasil que vibra ao som do fuzil
é a bandeira do rio de janeiro
que faz sambar o mundo inteiro
são palavras que que movem os morros
são palavras que rebentam na ressaca
são palavras que descem dos morros
são palavras que acordam as almas
são palavras que refletem guanabara
são palavras que refletem os sonhos
os sonhos da cidade ao ritmo do maracatu
os sonhos que se despenham das asas dum urubu
os sonhos da cidade ao ritmo do samba
apodrecendo numa enferrujada caçamba
a corrupção a corrupção
afoga os sonhos da população
a corrupção a corrupção
faz dançar a bandeira
num fogo de revolução
revolução revolução

Sôr Flamengo

ideias pró samba enredo da estácio


Ai ke mulher é essa
Ela está se levantando
e com ela toda a avenida
e com avenida salta todo o Rio
no alto das pernas vai sambando
toda a estácio
e quando ela ginga
todo o homem se ajoelha
e todo velho dá graças
ai ke mulher é essa
é um pássaro é um avião
é um brilhante tostão
é um gole de cachaça
é uma jovem criança
de sorriso que em tudo o que toca
vira ouro como o rei midas
ela é ouro
dos seus passos jorra luz
um brilho intenso
deixando um rasto de estrelas
e os corações apaixonados
é na avenida ou seja na tela
essa mulher é bela
ai ke mulher é essa
kem sabe que mulher é essa
a sua saia espalha
fogo de luz feito queda
de cachoeira
e toda estácio rejubila
com essa rainha
é tua, é minha,
ela é nossa de quem é essa menina
que por onde passa espalha magia?
Eiki
mulher
é essa
Está
se o sol a pôr
e a luna
já no céu vai brilhar

Mel na Nina


melanina
mal a nina
menina preta
menina
melanina
faxina
faxina
olhos da china
melanina
marca negra
negra sina
negra negra menina

duo ouro negro

Ideia para um Funk - Lacraia na Cueca - Vendo a ideia


Tinha lacraia quando fui pegar
quando fui pegar minha cueca
cueca tinha lacraia quando fui
pegar ela - picou, picou, picou
na bunda maldita lacraia
ai ai ai debaixo da saia
como um raio de fogo na pele
pele da bunda em fogo lacraia
de mil patas tatuagem
espalhando veneno debaixo
da saia paralisando as pernas

mc Nayler

4


Vamos vender-lhes a verdade barato
que já passa da validade
e assim libertaremos as prateleiras
do mercado
vem bucar-nos a consolação
uma luz uma nova fonte de água verdadeira


Como tempestade de areia
na ampulheta esquecida

3


Sou dotado como pai natal sempre com o saco pesado
aproximem-se meninas mal comportadas
venham renas atrás das chicotadas
senhoras pendurem as meias que eu dou-vos as prendas
estou de saco pesado cheio de amor para espalhar
pelo mundo fora todas as noites vou sair
passeando as moças no meu trenó

2

Era baixinha e o vestido branco com ananases estampados deixa à mostra os pernões roliços. Eu compreendo considerem a minha mãe uma mulher chata. O cabelo levemente loiro e levemente falso, a gula por cigarros distraidos a todo o minuto e a conversa empastada e melíflua emparedavem um ambiente à sua volta de falsidade e desleixo. A única coisa que fazia bem era lavar a roupa.

1


.
.
.
desenha limites à minha paixão
em que dedos possam tocar
uma fronteira prós olhos
uma cama pra alma se deitar

Fragmento I - o beijo ou o banho


...mbém o peso no coração sufocando-me em manhãs de noites mal dormidas...
Também nas coisas do amor se vão criando cisternas de dívidas alargadas pela dúvida onde ecoam os guinchos solitários da impotência e da vergonha. Engrossa a sensação de miséria não atinjo nada do que me propus e os horizontes afastam-se com a noção da pequenez dos passos que pensamos poder dar e com a certeza de que a morte é uma garota arisca que quando menos esperamos de nós se enamora e dum momento para o outro decide beijar-nos no meio da estrada ou enquanto nos banhamos no mar.

Nicolau Divan

escolhas - choices


Carros alemães, mulheres romenas, comida portuguesa,
vinho francês, festas espanholas, casas italianas,
música inglesa, morangos de sintra, combustível marroquino,
cebolas de chaves e alhos de alhos vedros

Filipe Elites

Entrada dos Mortos


O segundo nome deste blog era Archivos Mortos

Maconha et Circenses

"Vivemos numa época de racionanismo social - e o povão que engula!"
Alessandro Moreschi, o último castrato


Portugal pela escala e pela necessidade podia tornar-se um estado avançado do Brasil,já que, a união ibérica não surtiu efeito, após tentativas tão ambiciosas, falhada a coligação europeia que tantos dissabores nos trouxe, chegou a hora de depôr as armas como Vercingetorix outrora aos pés de César e deixar que a antiga sanzala se torne casa imperial, verguem a cabeça oh lusitanos como as américas fizeram perante o negro Obama e aspirem a ser capital dum reino que já calcaste como Maria esborrachou a cabeça do dragão.
É a tua oportunidade de voltares ao esplendor das capitais mundiais e a corrupção está-te tanto no sangue...
Durão



Vi-a balançar num gancho gasto de açougue
o olhar baço, cabelo desgrenhado o lábio frouxo
Kon


perguntei-lhe se a podia chamar pelo nome da minha ex...
macaco articulado


A glória recai sobre os que a não procuram
Como esta canção sobrevoa os que andam cegos pela rua
vivem a vida, casados com a música que os arrasta sem rumo
e a lua e a lua no alto dos céus enche-nos de glória
Pe. Zé


Um cornudo enamorado pela lua
abandona cedo a taberna e vai andando
baseado e vê as cores das fachadas
alteradas
Picardo

Sem Você Ver


amada ouça que tenho pra lhe dizê
te amo demais sem você ver
como o mineiro que sol não vê
extraio o ouro do seu sorriso
minha razão de viver

como as raízes da árvore mulher
como os pilares nobres do castelo
como a lua ilumina a cidade dormindo
como a âncora do barco atracado mulher

asseguro teu futuro sem tu ver
ilumino o teu caminho sem perceber
atracado no teu corpo feminino
com o desejo sem tocar mulher

Raimundo Nonato

Cravos



Se deus está nos detalhes
dos detalhes sou escravo
e se os cravo na tua carne
meus dentes são detalhes

entalhes esses sinais
que marcam o caminho
no braço tatuado dum cristo
pelo flagelo descarnado

tuas dores são detalhes
detalhes de deus teu escravo
caminho de carne sinais
nos braços cravados

(e o sangue...)

Nanahuatzin

16.6.11

Vidigal by Night

Street Fighter

fixação obsessiva atenção
esmagada sobre a carne exposta
com a corrosão do limão
infligindo dor - ela gosta

ela delira com a pressão
o choque dirigido sobre os quadris
ave em queda livre o avião
o turbilhão agiganta-se e tu ris

irisão angioma que aflora
ardor de prazer que faz ebulir
as lágrimas no pescoço amado

vêm agora os gemidos agora
o brandir do sabre a cuspir
o sangue no pescoço decepado

Zé Chove

Forró-Afandangado

caqui ou dióspiro
suspiro, suspiro e inspiro
cofio a patilha que é costeleta
e masco a pastilha-bala
e se a bala é bala
é porque com ela ninguém se mete
que ainda se mata
oh mata atlântica oh mate Leão
aqui pantera mais fraca é uma onça
e o torniquete baptizado catraca
Zé da Catraca sem que tenham de pagar portagem
que aqui é pedágio
não pelágio não ao negócio
não ao contrabando nas ruas do crack
mais um galho que se quebra
que se corre o bicho pega
que a pêga não é bicho até o cego enxerga
que o governo é o chupacabra
todo o mundo verga
perante a bunda mais larga
perante o mundo eu tiro o pote da farofa
e me chamam de bimbo que lá é brega
e danço tanto vira num samba de palavras
que a camiseta se cola à parte de trás
da t-shirt e desapareço, dou de fuga
em busca da frescura dum boteco no interior
resguardado da praia mais larga
escondida da polícia abafada de côcos frescos
e meninas de canga de pele morena
e uma estridência na voz que me deixa Corcovado

Sôr Flamengo

Condicional duma História Mais Longa

e se abandonar o nosso lar contrafeito
deixarei rastos da minha carne no hall do elevador
lunático e definhando caminharei as ruas sem ver o sono
como um cachorro rejeitado que lambe as chagas provocadas
pelo mijo seco dum leito passado

Filipe Elites

Controlo de Pragas

Depois de 3 meses de busca no Rio decidi aventurar-me pela Ilha Grande onde sempre precisam de garçons e copeiros num dos 250 motéis. Acabei por ser contratado naquele ano para integrar uma equipe de controlo de pragas símias. Os miquinhos andavam com a raiva. O nosso trabalho era proteger os turistas sem que se apercebessem da carnificina operada na selva infernal vizinha das paradisíacas praias. Os danados são loucos por bananas passadas do ponto enganávamos os macaquinhos como crianças doidas por gulodices... Chegávamos a casa com sangue até às cuecas. é incrível as litradas que tão pequenas criaturas espirram na excitação de se despedirem das selvas eternas para mergulharem no sono leve dos trópicos... Tudo é eterno de certa forma... O enjôo é que difere. Eu cansei-me de levar a matança a sério e passava os dias no mangue fantasiando em velhas lendas e crenças brasileiras.

Sôr Flamengo

Drave

Eu já desci a  serra em direcção à aldeia de Drave
Por entre encostas ruças e empinadas
onde se ouviam os pios melancólicos do milhafre
e o berro folgado da cabra

Maria Vouga

Mohammed VI of Morocco

Marrocos

gastei as minhas sandálias pelas 5 cidades imperiais
de Marrocos. Foi por altura do Ramadão de 2010 no ano em que o
pó secou todas as gargantas e enriqueceram os vendedores de chá de menta e sumo de laranja. Nas ruas apertadas os doces de mel cobriam-se de pretas abelhas zunindo de tanta doçura. Deixei que me ludibriassem os faux guides para sentir a graça de me levarem às suas casas.
conheci as riads decadentes das flácidas berbéres.
De todos os cantos mergulhados em sombra eu ouvia Róia, Róia
Amigo, amigo e quando me afastava sem largar a prata Portuguesis Tesis...
Nos açougues retiravam a pele da cara do camelo e as moscas vigiavam as patas de cabra ensangüentadas

Zé Chove

1.6.11

Eles são sombras

Eles são sombras
Recortadas na pública
Iluminação de sódio
Dos becos malafamados
São miasmas
Destilam ódio
Pelas gretas
Onde fogem as baratas
Tocam quem passa
Intrusivos infestam como peste
Nas narinas enojadas
Infiltram-se como mijo seco
Nas paredes das cidades
E fogem sob o cobertor de sarja
Da própria alma

Zé Chove

Silêncio-Incêndio

estalam os azulejos da velha casa
um fogo alto rebenta os telhados
o fumo grita louco pelo vale
e não se vê vivalma
é o ermo
a aldeia abandonada
fogem ariscas as raposas
rebentam os pinhos
rolam as pedras pela terra queimada
as chamas lambem infernais
o granito do cruzeiro
ao centro da praça alto e pardo
estrelejam as estevas ofendidas
e lançam o cheiro da desolação
mas não há quem veja
ardem em silêncio
as coisas esquecidas
ardem envoltas em melancolia
as pedras que homem esqueceu

Lúcio Ferro

Faz Chorar

Faz chorar ver consumir-se assim uma história
uma tradição tão antiga tão fincada na terra
como uma aldeia perdida nas faldas duma serra
faz chorar ver partir em silêncio a memória

Faz chorar uma intensa alegria alheia
de alguém tão feliz que também chora
por ver um filho regressar inteiro
faz chorar quando enfim chega aquela hora

Faz chorar relembrar a juventude
e a saudade é um fogo impossível de apagar
faz chorar não ter sabido aproveitar
e viver as alegrias em toda a plenitude

Tomás Manso

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...