14.7.07
Cit.#1 - Bernanos
Bernanos
Lux-Podre
Licor e fumo pela camisola abaixo.
Os vultos rasgam a luz de neblina.
Corpos langorosos que já deviam estar a dormir.
“Não abriremos as janelas, não queremos ver o Sol”.
Mais uma garrafa de vinho.
Ainda não falámos do Dostoiewsky.
Baixa um pouco a música pró vizinho não acordar.
Não percamos o ambiente,
Amanhã podes dormir no sofá.
Ritmos africanos batucavam nas colunas,
Enterrados no sofá, bem encharcados,
Púnhamos em dia as memórias de outrora.
Canção de Amor
Passeámos os dois através da sucateira ferrugenta de mãos dadas,
Beijámo-nos nos corredores sombrios da fábrica desactivada,
Meu amor urbano-decadente.
Eu gosto mais de ti nos becos abandonados sem saída.
O teu cabelo é de fuligem negra,
Os teus olhos brilham com a luz triste dos lampiões nocturnos,
O teu cheiro de trabalho guia-me como um cego,
Através do teu quarto soturno.
Adormeço na fuligem dos teus braços,
Envolto em sonhos de óleo gasto,
Passeio na antiga linha de comboio,
O cheiro do creosoto embala a minha paixão pela cidade gasta.
Zé Chove
Uma Nuvem Gorda
Uma nuvem gorda do tamanho da serra da Arrábida,
Arrastou-se lentamente através da noite.
Vai passar pela tua casa,
Descarregar nalgum campo de batalha.
Paulo Ovo
13.7.07
Com o Espigão da Lareira
Abocanhou um resto de peito de peru frio.
Barrou o cabelo com manteiga e saiu à rua,
Partiu como um louco em direcção ao rio.
Conteve-se para não gozar com um polícia,
Chutou com força um cagalhão ressequido.
Saltaricou como uma criança Avenida da Liberdade a baixo,
Fazendo barulhos de motores com a boca insano.
Batucava nos caixotes de lixo abandonados na noite,
As luzes cintilavam nas suas lágrimas incontidas.
Gritou como um bêbado quando pensou que estava só,
Algumas pessoas recebiam um grande sorriso outras o seu rugido.
Na sua agonia espalhava as entranhas pela rua da Madalena.
-Por quem chorava ele de amor?
Que alegria atingiu este rapaz?-
Andou de gatas e de rastos na Praça do Comércio.
O cansaço físico esborratou-lhe os sentimentos,
Um traço grosso de melancolia rasgou-lhe o peito.
Sentiu o cheiro e embalou-se nas ondas do rio.
Tentou vislumbrar o futuro com os olhos,
Só viu o negro da margem sul.
Chutou uma ratazana para dentro do rio,
Gritou “puta”.
Mandou uma mensagem a várias pessoas.
E continuou o seu passeio desvairado até de manhã,
"Quando a mente acalma e o corpo morre com o calor do Sol".
Zé Chove
Um Prédio
Um prédio de 34 andares jazia abandonado,
Lá dentro a vida era silenciosa para não chamar a atenção.
Quarenta famílias inteiras, uma escola, um posto de saúde e uma pastelaria…
Zé Chove
Saltava de Árvore em Árvore
Saltava de árvore em árvore engravatado,
“Não quero saber”.
Já disse que gosto de comer sopa no táxi,
“Quem é que não gosta?”
Vou fazer directas sem parar de olhar os teus lábios,
Vou fazer tudo o que me pedires com todo o gosto,
E quando me cansar lembro-me da tua graça,
Só tu conseguiste que deixasse de dormir no estábulo.
Vasco Vides
Depois de Jantar
Depois de jantar fui para a biblioteca de madeira.
Através da vidraça os ulmeiros agitam-se no vento da noite.
Sonho com bruxas e cavaleiros de outrora,
Contemplo a mais bela donzela adormecida no sofá de veludo.
Relembro os risos das crianças ao voltar da escola.
Antero G. Neve
Ah! Noite!
Os americanos universitários organizam festas em pavilhões pré fabricados.
Os Espanhóis nas pracetas, carros, som alto e álcool.
Aos franceses imagino-os a combinarem para incendiarem uma banheira.
Em Angola saltam na areia e batem nos tambores.
Vamos à discoteca?
Filipe Elites
Só, em casa
Só, em casa.
Tudo envolto na penumbra.
Gosto de rasgar as entranhas na solidão.
Penso nos outros com alegria,
Mas memórias têm um perfume manhoso,
Prefiro o cheiro da solidão.
Todos andamos para o fim,
Os corpos vão caindo no mar,
Lá já não estaremos sós.
Antero G. Neve
Oração Popular
Dá-lhe a chave do Menino
Quem a tem ,quem a teria
São Pedro, Santa Maria
Cruz em monte, cruz em fonte
Que o pecado não me encontre
Nem de dia ,nem de noite
Nem ao pino do meio dia
Já os galos pretos cantam
Já os anjos se levantam
Já o Senhor subiu à cruz
Que a minh'alma tenha luz
Para sempre
Ámen Jesus
Salta para dentro da minha van
Não quero saber porque me amas,
Só quero estar contigo,
Salta para dentro da minha van,
Vamos pró campo.
O sol deita-se atrás do rio,
A noite fresca chama por ti,
Se tiveres arrepios de frio,
Procura o calor, agarra-te a mim.
Vamos dançar sob a lua cheia, fazer planos pró futuro.
Diniz Giz
Morreu sem avisar
Morreu sem avisar os pais,
O pequeno moço matreiro.
Os manos desataram a chorar.
O velho poço coberto de ervas,
Gritou para céu quando o engoliu.
Agora as cigarras no verão gritam,
As andorinhas roçam as suas asas,
No pequeno túmulo do Pedrinho.
André Istmo
Puxava todo o folgo
Puxava todo o folgo da larga peitaça,
Escarrava terra seca com um estertor,
Parecia um motor ressequido.
Cravava as unhas a qualquer coisa que agarrasse,
Espetou-as depois na garganta com sofreguidão,
E marrou com força contra as paredes.
Ninguém nos avisa quando nos pode acontecer,
São desgraças que surgem sem avisar,
Qualquer um pode ser apanhado nas malhas do destino.
Zé Chove
Banheira de Azulejos Cor-de-rosa
Hoje revi-me de novo naquela banheira de azulejos cor-de-rosa,
Antiga da casa da vila.
Tomava banho depois de um dia de praia.
Gostava de ficar muito tempo na água quente,
Sorvia a água do fato de banho.
A casa de banho enchia-se de um vapor perfumado quente e sonolento.
Atravessava o corredor de madeira com a toalha enrolada na cintura,
E gritava - “Próximo”.
Vestia-me lentamente,
Estafado da praia,
A cara fervia do sol da tarde.
Penteado para trás e bem cheiroso,
Lá descia para a sala onde me enterrava no sofá castanho e desconjuntado,
E deixava-me anestesiar pela televisão.
Como eu, os primos, cada um com sua posição de leão empoleirado numa árvore, Moldávamo-nos aos sofás.
Mário Mosca
História do Visionário Magno
Imensidão
Universo
Coração
Adverso
Desperto
Sensação
Incerto
Explosão
Poesia incompleta
Carlos Marques
Super Produzida
com as cores da tua roupa,
e as argolas brilhantes das orelhas,
betinha tu és bonita.
Sorriste brilhante em pose estudada,
madeixa do cabelo sobre o olho,
senti teu forte cheiro,
através da noite louca.
Senti-me muito mais pequeno do que tu,
teus jeitos eficazes de senhora,
balbuciei embasbacado apaixonado,
e lá fui contente rua abaixo a teu lado.
Filipe Elites
Motard
fugi na mota,
os velhos saíram acorrer atrás de mim,
comprei te uma corrente prateada.
Cheguei montado numa nuvem de gasóleo,
tossiste com ar enjoado,
beijei-te à força,
atirei-te para cima da mota ficaste calada,
eu é que sei.
Manuel Bisnaga
Cachopita
ainda tens as pernitas arranhadas
de saltitares na floresta,
dou-te um beijo de compaixão.
As manhãs estavam sempre chuvosas,
para ti minha inglesinha,
com o estômago entediado,
enroscavas-te no sofá.
Vias os desenhos animados farta de estar em casa,
eu ficava na cama sem posição,
vem cá trás mo pequeno almoço,
e reacende a minha paixão.
Manuel Bisnaga
Luís
música dos eighties, mulheres despidas,
Luís de camisa e fio dourado,
flutuava largando cheiro barato e piadas brejeiras,
as luzes reflectidas no penteado oleoso,
botinha rítmica apoiado ao balcão.
Diniz Giz
Má Fama
voava suja, desamparada.
Asas imundas de lama,
atrás do dono de má fama.
Mário Mosca
Depois do moche
o anoitecer no oceano trazia o som de ondas antigas.
Deitadas as damas a conversar fizemos uma fogueira,
cantamos ao som das guitarras vozes amigas.
Somos livres,
jovens,
amamos a praia.
Vasco Vides
Pardalito
leva-lhe este meu recado.
A pequena princesa mimada quis uma rosa vermelha em troca do seu amor.
roseiras azuis, amarelas, laranjas e negras.
Por fim lá encontrou outras mas eram brancas.
Por seu amo cravou seu coração num grosso espinho tingindo uma das rosas de vermelho amor vivo.
Seu amo ficou perturbado com tamanha mostra de amizade,
quando chegou ao pé da princesa esta dirigia-se ao altar com o seu,
pior inimigo,
dor.
Madalena Nova
Convento dos Capuchos
palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...
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Entre 1241-42 os mongóis invadiram a Hungria. Lamento pela Destruição do Reino da Hungria pelos Tártaros Escrito por um clérigo da época. Tu...
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