19.3.08

Novos Ditos Populares

Pá na terra,
espírito berra.
Cheiro a morte,
garra forte.
Cova aberta,
alma desperta.

Maria Vouga

Decadência Urbana

De noite perseguido no
escuro pelo marulhar indefinido
das avenidas.

Lembranças que passam sem
deixar rasto mas
sujam o fundo dos ouvidos até
à insensibilidade.

Dispersos arrabaldes que
fogem à cidade mãe e
dormem à noite,
cada vez mais longe, filhos
dispersos, até ganharem
independência lá ao
longe onde criam as
suas próprias histórias.

Do ar vê-se: escondem-se nas
matas fronteiriças.

Triste da alma arrombo o
primeiro chaço que encontro,
decompondo-se com
um murmúrio surdo debaixo
de um velho lampião intermitente.

Zé Chove

Família

Archivo de imagens #25

Selado

Selado com ferro em brasa,
No vácuo escuro das masmorras,
Retorcia-se mole e gordo,
O mais gigante demónio.

Flutuava no fogo líquido,
Esperava com calma através dos milénios,
Trincando o ar desejoso,
Do dia do Apocalipse.

Zé Chove

13.3.08

A Lua

A lua essa gorda rançosa

Não me larga

nem aos peçonhentos sapos

que nas valas húmidas acasalam

e nas ruas escuras da vila

ainda há luzes nas garagens

e dispersas ainda se ouvem

gargalhadas reflectidas nas chapas

de alumínio das fachadas


mas o grosso é silêncio

evolado dos becos e baldios


não sei o que espero

nada me dizem os meus passos

não sei o que quero


Quem me guia é a lua

essa gorda rançosa

que não me larga



Filipe Elites

Fio Dental

Ficava sempre alarmado

quando o tio cagava sangue.

“Será que vai morrer?”

Como a alma o sangue não

deve ser perdido é

vital.

“O sangue é vida”

pensava.

E agora que perde litros

e litros ao lavar

os dentes

sente

C'o tio deveria usar

fio dental entre as nalgas.



Zé Chove

Switzerland, 1900

Archivo de imagens #24

27.2.08

Monte dos Vendavais

Conquistaste mais um forte,
da minha fraca vontade.
Amor sincero, afável,
todo teu te entrego.

Abafo o teu corpo descoberto,
solto a sombra do meu desejo,
cubro a brancura pura da tua face,
de imundos beijos negros.

Faca dilacera o teu peito,
sangue fluido imundo misturado,
no podre cancro do meu seio.

Na palidez enferma da tua pele,
surge o vergão vermelho infamante,
sou mau toquei-te de morte.


Diniz Giz

Paixão Exótica

Cães ladram na pradaria,
anciãos entoam lamúrios milenares,
no alto de minaretes na escuridão,
as estrelas chamam por ti.
A tempestade do deserto dança,
sou levado pelas dunas.
As formas da areia lembram o teu rosto.
guitarras ciganas fogem na estepe,
fogueiras derretem a neve,
pandeiretas imitam o ritmo do teu coração.
Nos altos penhascos de granito,
riachos frescos soltam neblinas,
e no meio de castelos em ruinas,
ecoa o teu nome nas colinas.

Carlos Marques

20.2.08

One Word More

Rafael made a century of sonnets,
Made and wrote them in a certain volume
Dinted with the silver-pointed pencil
Else he only used to draw Madonnas:


These, the world might view – but one, the volume.
Who that one, you ask? Your heart instructs you...
You and I would rather read that volume...
Would we not? That wonder at Madonnas...


Dante once prepared to paint an angel:
Whom to please? You whisper «Beatrice»...
You and I would rather see that angel,
Painted by the tenderness of Dante,
Would we not? - than read a fresh Inferno.


Browning

15.2.08

Serviço D

Serviço D
senha 31
mesa 2

trucum, trucum, trucum

"Estou aqui para dar resposta notificação"
__________Baby, can I hold you ton...
"sente-se, sente-se"
truc, truc, truc

Open space ortogonalizado ao meio
com cabinets vermelhos
escondidos
milhões de cabos
no falso tecto e no falso
chão

tiruli, tiruli
:::::::::::chuk, chuk,chuk

"si,si,sim, eu sei que você..."
protocolo 1058 - "Já analisámos a sua situação"

Serviço B
senha 12
mesa 3
Através de janelões modernos
a calma do jardim
vetrx
carregado de sinais
tou,tou,sim
dum estado novo - "Lucinda, da minha parte tá
tudo ok!"
troctroctroc
________vvvvtrusch lick

"Desculpe... podaguardarnasala?"
tiruliruliruli
"Já o chamamos"
flopfloskflop
___-Já enviamos à DARPAL?
huuum quistá seu comprovativo"
block.block.block
Zé? Zé? Não estou a conseguir aceder ao sistema..
CONTINENTE - ONTEM ORGIIIA AMANHÃ! (cantado)
flap,falp,flap
a cloud of sounds
souttxtx my brain
from ear to earliililil
"pois, agora tem de aguardar..."
@160 BPM
Talvez problema na base de dados
Garrafinhas com água
Já ligaste pró Back...


Orlando Tango

A Arca

A Arca,
de Aarão o bastão,
o maná,
e as tábuas da lei.
De prata,
e ouro os querubins.
E Deus,
cheio de misericórdia,
de pés
sobre o propiciatório.

A Arca
têm-na os etíopes
de éfode
vibram como David

Oh Arca!
és tu minha mãe?
A Lei
derrama-me no coração.
O Bastão
Abre-me o caminho seguro.
O Maná
que me encha de força.


Madalena Nova

Torre em Ruínas entre Rasteiro Matagal

"Desculpe lá... Vendem passarinhos?"
"Oh'mem pens' qu'a'gora 'tá d'fícil d'encontrar?"

____Os pesitos gordos forçando
____As sabrinas douradas
____quero morder-te aí mesmo
____Nesse bifinho transbordante

Filipe Elites

Poesia Popular Protuguesa

Nem imaginas a paz
que dá
não ter um segredo
se quer
não gruta bafienta,
cinzenta,
ser rochedo exposto
ao sol
e à tormenta

Maria Vouga

8.2.08

Balaão

22:22
God displayed anger because Balaam was so anxious to go,
and an angel of God planted himself in the road to oppose him.
Balaam was riding on his donkey, accompanied by his two boy servants.

22:23
When the donkey saw God's angel standing in the road with a drawn sword in his hand,
the donkey went aside from the road into the field.
Balaam beat the donkey to get it back on the road.

22:24
God's angel then stood in a narrow path through the vineyards,
where there was a fence on either side.

22:25
When the donkey saw God's angel,
it edged over to the side,
crushing Balaam's foot against the wall.
Balaam beat it even more.

22:26
God's angel continued ahead of Balaam,
and he stood in a narrow place,
where there was no room to turn right or left.

22:27
When the donkey saw God's angel,
it lay down refusing to budge for Balaam.
Balaam lost his temper,
and beat the donkey with a stick.

22:28
God then gave the donkey the power of speech,
and it said to Balaam,
'What have I done to you that you beat me these three times?'

22:29
'You have been playing games with me!' shouted Balaam at the donkey.
'If I had had a sword in my hand just now,
I would have killed you!'

22:30
The donkey replied to Balaam,
'Am I not your old donkey? You have been riding on me as far back as you remember.
Have I ever been in the habit of doing this to you?'
'No,' replied Balaam.


22:31
God then gave Balaam the ability to see,
and he perceived the angel standing in the road,
with a drawn sword in his hand.
Balaam kneeled and prostrated himself on his face.

Dos Números

30.1.08

25 Melhores Álbuns de Música de 2007

Top 25 Albums of 2007

1 - Mirah & Spectratone International – Share This Place: Stories And Observations
2 - The National - Boxer
3 - Beirut: The Flying Club Cup
4 - Radiohead - In Rainbows
5 - Churning Strides - Thee Stranded Horse
6 - Jesca Hoop – Kismet
7 - Panda Bear - Person Pitch
8 - Robert Wyatt - Comicopera
9 - Spoon - Ga Ga Ga Ga Ga
10 - Kanye West – Graduation
11 - Various Artists - After Dark
12 - Marissa Nadler - Songs III: Bird on the Water
13 - Burial - Untrue
14 - LCD Soundsystem - Sound of Silver
15 - Liars - Liars
16 - The Fiery Furnaces - Widow City
17 - José González - In Our Nature
18 - Rachel Unthank & The Winterset – The Bairns
19 - Laura Veirs - Saltbreakers
20 - Cowboy Junkies - Trinity Revisited
21 - Crippled Black Phoenix - A Love Of Shared Disasters
22 - Andrew Bird - Armchair Apocrypha
23 - Feist - The Reminder
24 - Dinosaur Jr. - Beyond
25 - The Veils - Nux Vomica

-A Bem da Nação-


Paulo Ovo

27.1.08

Cliffhanger


Pink Floyd

Tinha dificuldades em conter,
Os seus fluidos.
Acordava ainda noite ia a meio,
Com calafrios
No pescoço ensopado
em líquido amniótico.
Lacrimeja profusamente
Só de pensar em olhos.
Antes de apertar os ossos,
A um companheiro
Limpa o suor das mãos
Ao traseiro
Vive todo ensopado,
Chega a casa do trabalho intestinal,
E as meias marejadas de bílis.
E nos dias de Verão
Todos os regos e valas do seu corpo
São verdejantes e húmidos vales
De denso viço
Onde escorrem salgados rios
De linfa e células mortas.

Paulo Ovo

Biblioteca de Alexandria

Armazéns repletos de textos
E imagens sentimentais
Arderam ao sabor do vento desvarido
Com um ardor apaixonado
Tal espectáculo foi presenciado
Por um bombeiro reformado
Que por ali andava
E lá se foram:
“Os choros lancinantes no
ventre do dragão suburbano”
e “Os lamentos da viúva ecoando noite dentro
Na barraca abandonada nos baldios”
Em labaredas castanhas
“O escritório do médico louco
Uma rosa murcha e um calendário de 74”
E “A princesa infante morrendo à fome
Depois de trucidado o seu reino”
Lançando flamas azuis
“Flutuava morbidamente entre uma histeria
eléctrica e o desânimo mais cavernoso”
e “Os leões quando atacam aos pares são mais perigosos.
As gazelinhas gostam de pastar juntas”
Despedindo chamas vermelhas
“The suicidal ratio keeps rising
But why?
There are no more noble causes!”
E “Bebi demasiado amor fora do prazo,
Só desfaço a árvore de Natal em Agosto”
Ardendo em grossas línguas de fogo negras…

Marco Íris

Como Vómitos

O nosso governo soltou todos os criminosos,
Desde que lhes pagassem bem.
E assim as ruas voltaram a encher-se de alegria.
Alegria de traços-contornos
Negros e grossos
Pintalgada de cores esbatidas e mornas
Como vómitos.



Dionísio Pinásio





Novo Projecto do Sócrates



Espelunca

Esta espelunca
É o saguão do mundo
Uma supressão infecta
Onde resvalam todos os pategos
Que nem à gravidade resistem.
Deixei-me rebolar até este sepulcro
Já lá vão 17 anos,
E comigo toda a minha família,
Como nos baptizados
Proto-cristãos.
Os meus filhos nunca viram a luz do sol
Cresceram miúpes.
Eu vejo, o que me faz sofrer ainda mais.

Memories

Memórias não me deixam dormir
Flash de holofotes
No aeroporto adormecido
Há muito abandonado.
Partiste no último Charter
Sem qualquer destino.
Retive as tuas bagagens no hangar.

Manuel Bisnaga

Biscoitadas #1

Desvarios Assonetados

Subiu e desceu as escadas levemente,
Agitado sem saber bem o que procurava.
Coçou a cabeça tentando ter alguma ideia,
De cotovelo apoiado no corrimão fitou fixamente,

A luz na porta do seu quarto nas águas furtada.
Lá de baixo vinha o cheiro dos sofás velhos,
E o bichanar da t.v. notívaga de sonos,
Suspirou profundamente antes de decidir sair.

“Talvez lá fora haja alguma coisa para fazer”
Quem puxa é o corpo, embrutecido pelo tédio.
Puxou com força o cabelo para trás,

Deixou o frio lamber o seu nariz,
De mãos nos bolsos cantarolou até ao bar,
Mais próximo.
De novo o calor,
Ar gasto e álcool no sangue.
Saiu de ouvidos zumbindo a metal,
Os últimos carros abandonaram o parque acimentado,
Algo no coração ainda não se sentia satisfeito.
Deitou-se na relva e chorou ardendo em desejos,
De não sei quê que lhe dilacerou o peito.

Mário Mosca

Brothers

de dor
pois unidos jamais ficarão.

as doçuras loucas
o pranto em esperança
do irmão orgulhoso e cego de amor.

vêm descer o outro,
sujo com langor
a morder-lhe as esquecidas chagas
como um cão.

e os dois assim de novo
esmagados pela vergonha,
fedorentos da imundície morna
que tragaram
resfolegam doidos e sedentos da paz e alegria que mataram,
e berram em silêncio.

mordem os lábios contra si mesmos
infligem-se a si próprios dor
e querem começar de novo
porque o demo já se satisfez.


Lúcia

Tédio Melancólico

silenciosa e morna
tremia-lhe o peito agoniado
as unhas cravadas na almofada
de joelhos no tapete ao pé da cama
quando olhava pela janela do meu quarto

pela janela do meu quarto
distingui ao longe o ladrar dos cães
cigarras no silêncio
harpas de desejo
o céu enfermo e triste
sem saber vontade morta
sem centelha
com sol brando morto
e sem paixão ou afazer
que me mova

o céu roxo
silhueta do carvalho só.

Diniz Giz

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...