Sempre achei piada – sabem?
Sair de casa sem
Dizer nada a ninguém
Custa um bocado a princípio
Abandonar os domínios
Só para abocanhar uma pita
Hoje estava frio
2 graus 2º o painel publicitário
luminoso no topo dum prédio
pareciam espadas jedi
as cancelas iluminadas por baixo
e ao longe são naves os sinais
a irmandade da roulote
é família que se junta à noute
debaixo das suas asas sou mais um filhote
ainda hoje choro ao comer shoarma
Jerusalém na boca mais que na alma
No transistor o kizomba brama
De regresso a casa barulhos
Estranhos marulhos
Entre os arbustos
Já o estacionamento
Todo o betão estranhamente
Em profundo silêncio
Tentei não pensar no caso
Mas não fiquei sossegado
E comecei a sentir-me observado
Flashes reflexos de histórias
Quase todas escabrosas
Cometas na noite memórias
Açaimes, cães raivosos
Kostoglotov o traga-ossos
Seres escondidos em poços
Estalactites de imaginação
Das penumbras de grutas uma visão
Onde embatemos cegos com aflição
Tudo são fantasmas
Fagulhas inertes em caves mal oxigenadas
Que brilham sem chamas
Aproximei-me do muro
De casa e morri de susto
um rosto branco dissolvido no escuro
o coração bombeou cavalgante
mas nas veias gelou-se me o sangue
e de alma evoquei todos os santos
agora no meu quarto ainda
tremendo mas sorrindo
relembrando o episódio agora findo
quem conhece melhor minha casa que eu?
Ainda que sepultada no profundo breu
Nem sequer os anjos do céu
Revirei tudo em silêncio…
Carta encontrada debaixo
De Marco Íris morto na secretária
Do seu quarto
Com uma broca
Espetada nas costas
E um sorriso espetado na boca
Paulo Ovo