16.7.07
Ficámos Presos
Não morremos,
Falámos por pensamentos sem nos vermos,
Pensei que gostavas de mim.
Lúcia
Assustaram-nos de Morte
Deixámos de sair para a luz do dia.
Vivemos nas trevas ansiosos,
Pelo fulgor da nova luz e da paz.
Polícias por todo o lado,
As crianças correm no fundo do metro.
O sol não nasce há três dias,
O fundo dos cinzeiros anuncia a morte.
Corremos desastrados ao longo do hangar.
Gritaram que não bebêssemos do espelho,
Torpes e sem forças deitámo-nos em esconderijos,
E agachámo-nos por séculos.
No silêncio mais absoluto,
O vento chiou sozinho,
Alegre por ser tudo dele,
A face da terra manchada de luto.
Sonhos de tragédia acordaram em praias de sol,
As palmeiras deixavam cair os seus cocos,
Rachados deixavam fluir o mal,
Do seu ventre, molhando a terra de ódio.
Um cavaleiro fustigava o Tempo,
A fúria dos mares engasgou-se à sua passagem,
Bradou com rachas nas paredes,
“Ainda não é o fim animais!”
Estarrecidos sofrendo com o cheiro pestilento,
Continuámos a morder a lama,
Chafurdámos na morte sem poder gritar,
Esperámos a nossa vez de nos esmagarem pelas costas.
na vastidão do areal,
corremos sem destino ao sabor do vento,
de olhos cegos do sol brutal,
em busca de felicidade por um momento.
Mas uma nova luz vai brilhar,
E envolver-nos do leite sagrado,
Gritaremos de prazer e pureza,
Como bebés brincando no regaço do seu pai.
Zé Chove
Até ao Fim
Subo acima das trevas e contemplo,
As florestas organizadas com um batalhão,
Vejo o oceano em chamas.
O rio velho está a secar,
Peles de bovinos ensanguentadas,
Sobre o mármore do lagar,
Onde espremem as pêras.
Zé Chove
Dez Casinhas
Branquinhas de sal a brilhar.
À beira da falésia escarpada,
Ao fundo da velha estrada.
Viviam abraçadas como irmãs,
De cada lado um jardim de maçãs.
Compartilhavam o recheio de pessoas,
Vida alegre recordações boas.
Enfrentaram o inverno juntas,
E as crianças com as suas perguntas...
Paulo Ovo
Há Frente
Gritavam todos como galos,
Caminhavam em círculo,
Esmagavam tudo à sua passagem,
Pois andavam para trás.
Não queriam ver a lua de novo,
Atiravam esparguete à multidão,
Faziam chorar as velhas,
As crianças riam sem parar,
Quando algum caía para trás.
O céu trovejou sobre esta horda,
Enraivecido com a insolência.
Tapavam-se com folhas de alumínio,
Não haviam de parar,
Há séculos que andam para trás.
Já esfaimados e a cuspirem os pulmões,
À lua cheia continuavam a gritar.
No pico da sua raiva,
Caíram dum precipício para o mar,
Afogaram-se porque andavam para trás.
Zé Chove
O Projecto
Que não chegou a começar.
Debaixo do sol violento o pó no ar,
Misturava-se com o suor e sufocava.
Tentou imaginar a grande torre,
Sentiu o peso esmagador do betão.
Cravou as unhas na poeira,
Levantou as mãos bem cheias,
O pó caiu qual lençol dourado,
Cegando-o, espalhando-se pelo peito.
O projecto que ficara sem forma,
O desejo que permanecera mais belo no seu espírito.
Lúcia
Umas Gorditas
Eu dançava o dia inteiro,
O capitão comia sopa no porão,
À noite uivávamos à lua cheia.
Andamos em frota,
Há mil anos perdemos a rota,
Comemos gaivotas venenosas,
Alucinamos em ondas gigantes atirados pelo ar.
Estas velas não são nossas,
Venderam-nas ao coveiro que nos enterra no mar,
Sonhamos debaixo de estrelas,
A 2 escudos cada sonho.
Só o amor é que é livre,
Neste tronco de salvação,
Mas o Inverno é muito frio e,
Gostamos mais de esfregar o chão.
Zé Chove
Linfa na Estrada
Resina na colher de pau ressequida,
Os teus pneus amarram raízes,
Num novo mundo de vida natural.
Os papagaios invadiram Lisboa,
Todos os vidros se desfizeram em areia,
E o nosso amor tornou-se mais racional,
Num novo mundo de vida natural.
Zé Chove
14.7.07
Verme
Mergulhaste na terra como um verme,
Envolto na escuridão do húmus,
E preparaste o teu regresso.
Lúcia
Toda a família
Toda a família perdeu a virgindade,
Com a morte do mais novo.
Rezaram todos juntos,
Mais unidos que nunca.
Uma luz cega cai do céu,
Envolve o clã e separa-os do mundo.
Agora compreendem a vida,
Agora entendem a morte.
André Istmo
Perdão
Cada vez mais gastas as palavras.
Quando é que me rebentas com um estalo?
Oh! Todo-Poderoso ajuda-me!
André Istmo
Já Tentámos Tudo
Já tentámos tudo.
Batotas foleiras,
Era a forma mais directa.
Não temos tempo.
Morreram as esperanças,
Os bifes arderam nas brasas.
Os estômagos roncam em ácido,
Deitados no chão em desespero.
Não buscávamos algo concreto,
Só queríamos satisfação.
Não nos queixávamos da dor,
Só a rotina mata de desilusão.
Aqui ao lado vivem da matéria,
Lá em baixo comem carne todos os dias.
No meio do nosso desespero,
Só nos resta um estáter dentro dum peixe.
André Istmo
Tristes Trópicos
Será que alguma vez vão aprender?
No meio de rumba e de flores,
Qual o sentido da vida?
Não hão-de preferir a música do Sol?
Paulo Ovo
Mergulhar no Sonho
O despertador tocou,
Despertei com o Sol na vidraça,
O corpo ainda não estava preparado,
Voltei a mergulhar no sonho.
Nessa letargia matinal,
Em quinze minutos eternos,
Atravessei palácios de luz calma,
Paisagens sombrias sagradas.
Respirei profundamente de prazer,
Voltei a mergulhar no saco de aço,
Refunfunhei na almoçada fresca,
Acordei de novo para almoçar.
Gritas que sempre a amarás
Gritas que sempre a amarás,
Estás louco por ela,
Cortarias os pulsos por ela,
Mas ela continua calada.
Agora que ela foi com outro,
Nem olhou para ti,
Não és nada para ela,
Enforca-te e mostra o teu amor.
Tenho a certeza nessa altura,
Do desespero em que se abre o cadafalso,
Virá um anjo em teu socorro,
“Baixa esse cutelo”.
“Eu amo-te com loucura”.
Filipe Elites
Todos foram à festa
Todos foram à festa menos eu,
Fiquei em casa a tentar compensar.
O sol brilha tudo parado lá fora,
Os olhos saltitam sem terem nada em que pegar.
Imagino as crianças a brincar no lago,
As moças bem vestidas a palrar,
Casais risonhos a contemplar,
O passado e o futuro do seu lar.
André Istmo
Cit.#1 - Bernanos
Bernanos
Lux-Podre
Licor e fumo pela camisola abaixo.
Os vultos rasgam a luz de neblina.
Corpos langorosos que já deviam estar a dormir.
“Não abriremos as janelas, não queremos ver o Sol”.
Mais uma garrafa de vinho.
Ainda não falámos do Dostoiewsky.
Baixa um pouco a música pró vizinho não acordar.
Não percamos o ambiente,
Amanhã podes dormir no sofá.
Ritmos africanos batucavam nas colunas,
Enterrados no sofá, bem encharcados,
Púnhamos em dia as memórias de outrora.
Canção de Amor
Passeámos os dois através da sucateira ferrugenta de mãos dadas,
Beijámo-nos nos corredores sombrios da fábrica desactivada,
Meu amor urbano-decadente.
Eu gosto mais de ti nos becos abandonados sem saída.
O teu cabelo é de fuligem negra,
Os teus olhos brilham com a luz triste dos lampiões nocturnos,
O teu cheiro de trabalho guia-me como um cego,
Através do teu quarto soturno.
Adormeço na fuligem dos teus braços,
Envolto em sonhos de óleo gasto,
Passeio na antiga linha de comboio,
O cheiro do creosoto embala a minha paixão pela cidade gasta.
Zé Chove
Uma Nuvem Gorda
Uma nuvem gorda do tamanho da serra da Arrábida,
Arrastou-se lentamente através da noite.
Vai passar pela tua casa,
Descarregar nalgum campo de batalha.
Paulo Ovo
13.7.07
Com o Espigão da Lareira
Abocanhou um resto de peito de peru frio.
Barrou o cabelo com manteiga e saiu à rua,
Partiu como um louco em direcção ao rio.
Conteve-se para não gozar com um polícia,
Chutou com força um cagalhão ressequido.
Saltaricou como uma criança Avenida da Liberdade a baixo,
Fazendo barulhos de motores com a boca insano.
Batucava nos caixotes de lixo abandonados na noite,
As luzes cintilavam nas suas lágrimas incontidas.
Gritou como um bêbado quando pensou que estava só,
Algumas pessoas recebiam um grande sorriso outras o seu rugido.
Na sua agonia espalhava as entranhas pela rua da Madalena.
-Por quem chorava ele de amor?
Que alegria atingiu este rapaz?-
Andou de gatas e de rastos na Praça do Comércio.
O cansaço físico esborratou-lhe os sentimentos,
Um traço grosso de melancolia rasgou-lhe o peito.
Sentiu o cheiro e embalou-se nas ondas do rio.
Tentou vislumbrar o futuro com os olhos,
Só viu o negro da margem sul.
Chutou uma ratazana para dentro do rio,
Gritou “puta”.
Mandou uma mensagem a várias pessoas.
E continuou o seu passeio desvairado até de manhã,
"Quando a mente acalma e o corpo morre com o calor do Sol".
Zé Chove
Um Prédio
Um prédio de 34 andares jazia abandonado,
Lá dentro a vida era silenciosa para não chamar a atenção.
Quarenta famílias inteiras, uma escola, um posto de saúde e uma pastelaria…
Zé Chove
Saltava de Árvore em Árvore
Saltava de árvore em árvore engravatado,
“Não quero saber”.
Já disse que gosto de comer sopa no táxi,
“Quem é que não gosta?”
Vou fazer directas sem parar de olhar os teus lábios,
Vou fazer tudo o que me pedires com todo o gosto,
E quando me cansar lembro-me da tua graça,
Só tu conseguiste que deixasse de dormir no estábulo.
Vasco Vides
Depois de Jantar
Depois de jantar fui para a biblioteca de madeira.
Através da vidraça os ulmeiros agitam-se no vento da noite.
Sonho com bruxas e cavaleiros de outrora,
Contemplo a mais bela donzela adormecida no sofá de veludo.
Relembro os risos das crianças ao voltar da escola.
Antero G. Neve
Ah! Noite!
Os americanos universitários organizam festas em pavilhões pré fabricados.
Os Espanhóis nas pracetas, carros, som alto e álcool.
Aos franceses imagino-os a combinarem para incendiarem uma banheira.
Em Angola saltam na areia e batem nos tambores.
Vamos à discoteca?
Filipe Elites
Só, em casa
Só, em casa.
Tudo envolto na penumbra.
Gosto de rasgar as entranhas na solidão.
Penso nos outros com alegria,
Mas memórias têm um perfume manhoso,
Prefiro o cheiro da solidão.
Todos andamos para o fim,
Os corpos vão caindo no mar,
Lá já não estaremos sós.
Antero G. Neve
Oração Popular
Dá-lhe a chave do Menino
Quem a tem ,quem a teria
São Pedro, Santa Maria
Cruz em monte, cruz em fonte
Que o pecado não me encontre
Nem de dia ,nem de noite
Nem ao pino do meio dia
Já os galos pretos cantam
Já os anjos se levantam
Já o Senhor subiu à cruz
Que a minh'alma tenha luz
Para sempre
Ámen Jesus
Salta para dentro da minha van
Não quero saber porque me amas,
Só quero estar contigo,
Salta para dentro da minha van,
Vamos pró campo.
O sol deita-se atrás do rio,
A noite fresca chama por ti,
Se tiveres arrepios de frio,
Procura o calor, agarra-te a mim.
Vamos dançar sob a lua cheia, fazer planos pró futuro.
Diniz Giz
Convento dos Capuchos
palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...
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Entre 1241-42 os mongóis invadiram a Hungria. Lamento pela Destruição do Reino da Hungria pelos Tártaros Escrito por um clérigo da época. Tu...
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palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...