23.7.08
Hino ao Irmão Vento
Não é o tempo que afoga é o momento
Nada fundo pranto sob-desalento
Ninguém assiste à queda pára o tempo
Nunca alcança o proposto alcanço
Nenhuma inércia aguenta tal balanço
Não não é a luz que dá o avanço
Nada aponta o vento sem descanço
Não basta um folgo intermitente
No girar do mundo pendente
Nalgo mais constante mais permanente
Necessita o barco do sopro fulgurante
Não é da luz potente o movimento
É do vento é do vento incessante
Orlando Tango
Sequência X
com paralelas de luz
a clareira é possuída
a metade observa a metade
já tomada num silêncio emprestado
todo o ser noite
Zé Chove
Substracto I
dilui-se em contacto com o segundo
o suspiro grava a vergastada
no campo de areia virginal
onde se encavam destroços
doutras palavras
Zé Chove
Vertigens
da desolada aldeia
é casa de aranhas
contemplo os campos celestes
sentado numa ameia
perto duma densa teia
à vertigem que revolve as entranhas
dobro-mesobremimmesmo
e caio desamparado na teia
Ivo Lascivo
22.7.08
Memória Descritiva
As perspectivas
Enquadro um segundo ponto de fuga
O horizonte afunilado num vértice
Um monumento de céu
Hiperbolizo a esférica calote
Em densa malha elíptica
E envolvo a ubiquidade do ovo
Em esquizóide mutação de superfície
Matriarcal não me permite
Nascer de novo. Rarefeita
a linha infinita é elusiva
charneira
e cruza um ponto sobre mim
em paralela dimensão que não existe
Zé Chove
Certidões de Registo – 2ª Conservatória
The Cantos – Ezra Pound
Poema Contínuo – Herberto Helder
Aqueronte
Nos limites crispa e baralha em
Espelhos líquidos de mil brilhos
Limalhas flamas sol sereno sol
Em dorso de sardinha
O inferno é uma eterna solidão
cantaste-me olhos nos olhos
nas margens do Arlanzón
Lúcio Ferro
Hermetismo
fechado purifica em gás desolador
inverno cerrado ao incauto
abre as portas do inverno o excesso
estalactite sobre estalactite
de gélidos tupperwares em vácuo
transparente gelo prisão eterna
de flores
Orlando Tango
Aditamento #5
Yeasayer's – All Hour Cymbals
The Tough Alliance – A new Chance
Vampire Weekend – Vampire Weekend
Amantes
E afaga o cabrito-sol
Perseguem-se como dois amantes inconfessados
Brincam tocam-se cedem e concedem
Envolvem-se azeite e água e choram
Assim assim uma vez e outra sem nunca se falarem
Exibem troféus seus anjos
Emprestam e experimentam sobre as mesmas árvores
Mas quem diz que se conhecem?
Madalena Nova
Neo-Realismo
a víbora a si própria se engole
sonhei através do grande vidro
sobre a floresta sentado na carpete
verde escura duas garotas de botas
de cano alto
reclinadas nos sofás
cor-de-laranja com aspiradas cabeleiras de piche
e olhar entediado a chuva no vidro leva
a agradecer a vida moderna
o candeeiro de plexiglass alveolado
tremelica lá fora o céu troveja
Filipe Elites
Não Desistas
Vem tudo é glorioso no tempo
Talvez se liquefeito em petróleo
Sob as mornas banhas duma lama
Ou num esquecido fogo fátuo já depois
De soterrado levanta vôo a coruja
É um gaz mas é brilhante
A plena glória do ser
Nicolau Divan
Excessos Exegetas
choram vinagre coalhado de mosquitos
as crianças atiram moedas
com violência
para afonte e não vão buscá-las
algumas tribus de exegetas
corroídas pela vaidade
as volutas de violinos
e as massagens com ímans
os passeios na Babilónia
saciavam de fome
um espirro
e nem chegámos a preencher
os requerimentos
fugimos
lúcia
Meditação Oriental #4
Servida está a tigela de lava
Não tens de comer as vísceras
Porque choras?
E o prazer se te descoso as feridas antigas?
Engolidas as caravelas
Defecados os brasões
Foram aplanados os montes os vales
São agora alcovas
Olhos perdidos por planícies
Crivadas de bocas sem fundo o rio
Subterrâneo de olhos sem luz
É vomitado em canto negro onde
Se banha de pálpebras descansadas
Um Maldoror
Ou será o Magog?
Lúcio Ferro
Cit.#12 - Arctic Monkeys
Too heavy to hold, too heavy to hold
Arctic Monkeys
Chico...
Os seus frutos apodrecem agora no chão
Gritei-lhe
Nada escondas do sol
Então só me via o halo
Excitava a parte gorda dos braços vergastados
Antes de afogá-la
Filipe Elites
16.7.08
10.7.08
Restos
Sob o leito do moribundo
Gemendo na penumbra
O tempo passa vermelho
No relógio digital
Mantos de veludo entapam o salão
Mágoas ensombram o coração
Pesam os maples de tons escuros
Abafam as lágrimas de luto
Rápida passou em queda
Turbina no lago espelho
Pluma negra flutuando
Veloz como uma flecha
Beija o lago suspensa
Rui Barbo
Danças de Salão
Levada ao bloco operatório
A sua carne pura de infante
Exposta
Traça um meticoloso golpe
Divide o músculo em duas margens
E a carne é boca são rosas
Florescem
Lúcia
9.7.08
Merge
“A palavra começa a existir com carácter necessário pela ausência e transitoriedade das coisas, isto é, pelo tempo. A palavra, filha do tempo, nasce contra ele, para remediar a sua acção mortal”. José Maria Valverde
“Mas outros, Raça do Fim, limite espiritual da Hora Morta, nem tiveram a coragem da negação e do asilo em si próprios, viveram foi em negação, em descontentamento e em desconsolo.”FP
"Todo o estado de alma é uma paisagem. (…)Há em nós um espaço um espaço interior onde a matéria da nossa vida física se agita. Assim uma tristeza é um lago morto dentro de nós, uma alegria umdia de sol no nosso espírito.
(…)Temos ao mesmo tempo consciência de duas paisagens. Ora, essas paisagens fundem-se, interpenetram-se, de modo que o nosso estado de alma (…) sofre um pouco da paisagem exterior (e vice-versa).
De maneira que a arte que queira representar bem a realidade terá de a dar através duma representação simultânea das duas paisagens (…) terá de dar uma intersecção das duas paisagens".FP
Paisagem – tudo o que forma o mundo exterior ou interior num determinado momento da nossa percepção.
[música, leituras, estudos, calor, doença, barulho]
Nos sonetos podes definir 4 imagens ou passos e desbrochas cada uma à la Baudelaire.
Outros vão escrevendo semi-automaticamente sobre vários temas.
Vão recolhendo e misturando e adulterando textos de outros autores.
Começam a formar vários blocos sedimentares sobre temas de fundo.
Esculpe então uma forma que desde o início estava enterrada dentro dos vários textos iniciais. Como uma mãe nunca vê defeitos no seu filho, entrega-o nas mãos de um tutor amigo (Ezra Pound) para que este o ajude a crescer.
Lúcio Ferro
Sequência X
Só conheço a noite
E vejos os fogos
Na outra margem do pântano
Livres da multidão dos grãos
Os galhos veneram a lua
A água e a lama lambem-se
Uma à outra em polvorosos lamentos
Entumescendo as raízes
Ao crisol dos ventos gritam os fogos
Carpindo as árvores decompostas no atoleiro
Sem aquecer o funil da noite
de "Ética Manicómio"
Zé Chove
8.7.08
Sou Guiado
Forço para fuçar nas lamas e poças
Resvalo na calçada e como a erva
Furiosa besta de imensa força
Com a delicadeza de fêmea esbelta
Dirige-me mão firme com a destreza
Do indiano que guia o elefante
Porta-aviões nas unhas do comandante
Mas fui eu que me entreguei afinal
Farejei a eternidade numa gamela
Podengo abanei a cauda submisso
Ai se agora sou mais animal
E tento alargar o compromisso
“Meu anjo não te me largues a trela”
Lúcia
Está Longe
Como leões escondidos no matagal
Que a gazela cabisbaixa não divisa
Contentando-se com a erva seca à sua volta
Enchota as moscas com a cauda
Que lhe sugam o sangue nas feridas
E desdiz a vida entre os arbustos
Sem saber que espreita a alegria
Refundido entre a savana
Com esgares de predador
Respirando a tensão do ar
Só quando sentimos perto a garra
Saltamos graciosos com terror
Da alegria da morte santa
Lúcia
Corres
Não tens mais contas a pagar
Saltas em câmara lenta
De cabelo ao vento
Com a alegria da criança
O Verão está a arrebentar
Todas as flores com novos cheiros
Um amor intenso no coração
Todo o céu a brilhar
E ao fundo mar infinito
E a alma livre e límpida
E os sons matinais do mundo
Envolvem-te numa doce sinfonia
Tudo está em ordem
Tudo palpita em harmonia
Marco Íris
Vizinha
Nas ondas do sol és uma sereia
Mas se te bamboleias
És mais leão marinho
E se à mão tivesse o arpão
Sulcava o teu corpo
Faminto de teu óleo de baleia
Diniz Giz
Ratazanas e Lagartos
Rápido das pombas nos beirados
Marchava obcecado com o rastejar dos lagartos
E ratazanas nos arbustos secos no carreiro
Orlando Tango
7.7.08
IV
brilhante derme a lágrima
não aguenta o espelho
e funde-se em água
Orlando Tango
AlexanderPlatz
respiram máquina e árvore lado a lado
brisa balsâmica velada de divindade
da plenitude do aquário de mil sóis
é horizontal o crawl voraz da máquina
o barro cego funcional plasticidade
moldando ao labirinto do engenho as paredes
Corpo e alma carne e espírito geme a árvore
Esticada entre polos de verticalidade
Co-princípios que lhe garantem a unidade
navegar é preciso, viver não é preciso
Filipe Elites
Sequência I
à árvore o sangue prova a seiva
compadecida dos lenhos
sinal da casca e
percorre os leitos
desde as raízes
identifica os séculos
elevasse
e busca os ventos com os dedos
perdidos entre os ramos que
só a noite
conhece
Zé Chove
Sequência I
Do fruto fermentado
Só voga de noite o barco mítico
E assombra os peixes de dia
E as algas mortas escrevem a pureza
Das areias brancas
Crescem o relevo
Polpa dos frutos enjoa
A árvore enjoa
Onde chafurda
Toda a gamela
Presta culto ao nada
Transborda lama
Vulcânica
Ração de marrãs
A nobreza do bago temprano
Destila vileza
Ao sol de justiça exposto
E breve seca
Sequência I
Tremer as folhas
Novos corredores iluminados
Na antiga biblioteca
A densa noite aguça a
Verticalidade da multidão
Das árvores
E o silêncio desmentido
Em proverbialidade extracta
Acrescenta opacidade
Aos corredores da biblioteca
São pauta e sulco os sons do dia
E advogam ser dum universo espelho
Mas é a noite que mesmo sem querer
Perfumam
Ah o mistério
Suspiram os troncos
Por um vulto estranho
“O que abarca a vista é uma casa”
Árvores que a-
Prenderam a ver o musgo
Como benesse a perpetuação da lua
Caminho de ascese
Permanência de mistério
Durante o dia
Vibram à mutação
Quadrante dos recortes na luz
Mais e mais negros
Se mais e mais se ajuntam
Até serem noite
E a sombra deixar
De ser mistério
Zé Chove
Sequência I
Onde um trote se aproxima
Da alma desolada como um castelo
Urgência que desperta do húmus
Que deixámos passar entre os pés
Buscando a noite sob
Os seixos do rio
Através do telhado numa jangada
De pedra extasiado
Com os reflexos do sol
Abafa nossos ramos
Auxilia a leveza da nossa cepa
E afoga-nos em teus redemoinhos
Zé Chove
5.7.08
Raios Gama
Todos os vizinhos se queixam
Quando o sino te lambe os tímpanos
Pela matina ainda tens o olhar fixo
No sofá de veludo verde a teus pés
Semi-deitada lá se encontra tua mulher
Aspecto de cartoon a preto e branco
Mais um clarão de raios gama faz transparecer
Por milésimos de segundo as paredes do prédio
E contemplas o esqueleto dos teus filhos na cama
Mário Mosca
Engenheiro Civil
O bem estruturado engenheiro
Cínico olhar exprimia rigor
Sapato oleado de cangalheiro
E colarinho colado ao pescoço
No metro transparecia
Fórmulas de pose calculada
Fulminou-lhe desdenhosa o escapulário
E ele disparou sobre o peito decotado
Filipe Elites
Dreams #1
Meu sonho é morar à Miami
Num casarão branco ao sol
Com relva e piscina no jardim
Janelões e palmeiras em volta
Torres
2.7.08
Anthologia de Textículos #6 - Lautréamont, Saint-Exupéry, Echevarría
Cantos de Maldoror – Conde de Lautréamont
Cidadela - Saint-Exupéry
Da Epistemologia [1ª lição] - Fernando Echevarría
À sombra em que se oculta o repentino
Sem fim do nascimento, aonde estamos,
Embora a sombra esconda que o cumprimos.
E vermos na demora advém destino
De perdermo-nos de onde ainda estamos,
Pensando a sombra como um outro sítio.
É sombra ainda a invenção da hora
Em que se cumpre o sonho da passagem.
De lentamente ver, se erija aragem
O repente sem fim que ver demora.
Afogo
Afogo os dias
em abundância
de bem e de mal
sou cisterna ávida
sem rachas ou gretas
albergo o marasmo
de marés nojentas
e remansos de puras águas
vêm a mim beber iludidos
toda a casta de animais
pois também brilham os rios
onde bóiam cadáveres
1.7.08
Não penetra
Não penetra o pássaro a copa do pinheiro?
Foi Deus quem no-los concedeu
Para que não pecássemos mais
São mel do nosso favo
E fibra da nossa cepa
Perpetuação duma raça
Onde vagueiam vultos
Definem uma sugestão
De paisagem habitada
Cada palavra que constitui o
Texto liberta vultos nessas moradas
Sinónimo de corda de fios…
As pétalas dos meus olhos
Não impeço o seu calor
De dissecar os meus olhos
Esvoaçou desmaiada à volta do teu corpo
Do sol de fim de tarde
E serpentinam de luz a cidade
Mkristu miye niko salama
Shetani we, si nyie
Arrrgh o ar não tem ar.
Reflectido nas poças?
O poço de Babel
Logradouro alegre de ritmos
Em espiral torvelinhos de suspiros
E aromas de roupa lavada
Assados, qualquer coisa podre
E qualquer coisa longínqua
Maresia
Orlando Tango
Convento dos Capuchos
palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...
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Entre 1241-42 os mongóis invadiram a Hungria. Lamento pela Destruição do Reino da Hungria pelos Tártaros Escrito por um clérigo da época. Tu...
-
palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...