31.5.12

Quem dera ter tido um amor


Não tenho nenhuma paixão de longa data
que não vejo à décadas por que os nossos passos
se separaram mergulhando na melancolia
de doces memórias a reviver um dia

não conheci a garota na força da juventude
abraçando-a numa prisão de loucura e músculos
nem chorei depois sem forças a nossa partida
porque não conheci, moça, mulher ou rapariga

Mas abate-se sobre mim nos fins de tarde
quando a solidão aperta nos prados verdes pardos
uma espécie de triste vontade que me afunda

de ter tido no passado um amor por quem pudesse chorar
alguém a quem quisesesse de uma forma tão profunda
que me levasse a implorar, implorar, implorar

Brasil Fora


A estrada vai cruzando a mata por entre montanhas
e vão se sucedendo as aldeias todas pobres de cores garridas
com seus letreiros flashes de móteis e igrejas evangélicas
as gentes sempre iguais derreadas transportando secretas cargas

Cachaça e Tim Maia


Desce até à mureta da Urca vem afogar
as mágoas nas águas paradas da Guanabara
entre as barcas e os reflexos e o lixo e as algas
desce depressão afogada em cachaça e Tim Maia

vem chorar sozinho o final do Carnaval
vem chorar afinal mais um vice conquistado pelo Vasco
vem chorar sem consolo só chorar, chorar, chorar
e em lágrimas tanto desgosto afogar

É mais funda a tristeza de quem está triste
e convive no meio de tanta alegria
Carioca é um povo que assiste todo dia

à profunda turbação da alma que desiste
de ascender ao patamar da felicidade maior
se afoga sem amigos, sem paz e sem amor

Caganeira no duche


ao terminar o duche, já tinha a mão na torneira
tive vontade de mandar um peido
naquele segundo de dilatação do esfíncter
sem fazer qualquer tipo de força para que o ar saísse
senti algo que aflorava
não tentei prender, uma caganeira líquida respingou todo o box
deixei a água fluir arrastando pedaços de antigos jantares
fui limpando a superfície usando os pés para empurrar a água cagada
enquanto lavava de novo o rabo com um sabão branco.

Tempestades


Os espasmos do vento na cara da imponente escarpa
escapam-se pelas paredes, varrem os valados
e caem pelos pelos abismos em vertigens loucas
e ganham nova vida nas florestas de folhas

rasantes rasgam a superfície dos lagos
espalhando convulsas palmas e uivos bravos
sempre que as rugosidades vibram
ou os planos se abrem em rasgos largos

e os afunilamentos se desengolfam brevemente
em amplos espaços de céus dormentes
e os sufocos expiram agudos se tornam graves

e fazem ribombar nas frentes mornas
que sobem fétidas das tristes cidades
inclementes e luminosas tempestades

Desempregado


Uma espargata de dor bem esticada
Ao centro até que os côcos vertam
O leite macerado de uma vida inteira
Atrás duma escrivaninha lavrando

Os desígnios dum tal mestre de lavores
Ufano de cabeleira de chumbo sobre os teus
Ombros carrega o fardo de olhos postos
Na recompensa um fardo de palha

Empina-te ao sol de Verão  e malha
O brio o brasão a honra da familia
Um carimbo na testa o orgulho o frontão

A ruína adivinha-se pelo cheiro a milhas
E milhas num sobretudo bem sovado
Pelos ermos da cidade ofega o desempregado 

Calmaria

O mar brandindo sinas quase sem voz
Nos raios e trovões da noite escura
Traça um raio de lés a lés na carne
Um trago sequioso de água salgada
É a certeza de um caminho já provado
De estrela em estrela pelo abismo dado
Em que se perdemos a certeza
Foi dos olhos cegos pelo arpão da besta
Um par de cornos sentado na proa
O passadiço bem lustrado de joelhos escova
O cabrão como quem maneja o leme
Dorme nos vapores do brandy
E sente o peso da peste hasteada
Nos mares nauseabundos da calmaria

Salmo 4


Sangrem os olhos por trás dos vidros
e o vermelho nos vidros é o soco que fica depois
do acidente como um caco velho
gingando na ferrugenta cicatriz
o sol dura um segundo e um grito
rasga toda a pele ano após ano
o embate dos cinquenta deixa-nos sem fôlego
uma vida toda para isto
morremos tantas vezes
sempre com o sobressalto da primeira vez
a morte traz-nos jovens
mas o nosso corpo reclama pelo conforto da putrefação
Que a luz nos atravesse cheia de graça
Senhor leva-nos jovens

Salmo


Oh bela cruz que cravas na terra
E me gravas nos sinos
Hás-de-me lançar nas eras
Por altas serras rasando os pinos
E arrastarei até ti num beijo
Os loucos, uma ou outra espada
Umas crianças vestidas de branco
Pedaços de reis e mil velhas de joelhos
Tudo se queime na tua presença
Como mirra fragrante

não +e


Não é assim também a natureza?
Terra, terra, paus, raízes ervas pedras
Muito de raro uma flor no meio da água
Ou no céu de tanto sufoco talvez uma estrela
Bem definida no meio do nada
Que tudo a si atrai como algo que podemos chamar
Como no meio da palha uma palavra

Salmo

Roturei a terra com o rosto retesado
como cangalho o meu corpo
Seco ossudo burro terra pó e sol eu sou
Lavro dia a dia os campos do Senhor

24.5.12

Maranhos


Lusaglória


Passou já a nossa hora
e o sétimo dia dos nossos feitos
prolongou-se enfim pelos séculos
e durante o nosso sono
roubaram de nós o mar profundo

e nem assim despertou em nós a angústia
de tão moribundos
fedem a morto as palavras dos antepassados
e passamos a saudade nos sovacos
e ri das nossas quinas a europa sarcástica

Brás

Oh Chelas! Oh Chelas!


Esquecida num canto de Lisboa
és o bairro da igualdade
das vistas do Tejo nos altos dos prédios
a tua espinha de feira
um relógio semanal
uma fartura
ouvem-se os tiros, ouvem-se os negros
um romeno e um baiano
tacanhas avenidas que tentam separar a gente
tuas escolas tristes entre baldios
terra do mundo do continente africano,
europeu e americano,
terra de velhos fadistas
cruzam-te agora os calções hipoppers
terra da rtp do rock in rio e dos ciganos
canaviais ao vento um pobre relvado
terra modernista de células e bairros em letras
um céu de gaivotas imenso
cafés da gente feia e dos arranha céus compridos
das igrejas evangélicas e dos galpões vazios
uma pedrada na vidraça um barracão caído
filha de retornados
em fato de treino encarnado
velhas de sacos
conversas de velhos com velhos
e jovens conversando com drogas leves
cortiço antigo sem filhos
um dia correu em ti um rio e um carreiro de monges beneditinos
escarpas que dás á cidade esboroadas à vista do aeroporto
cidade dentro da cidade altaneira e sombria
teus versos de miséria o governo silencia
tua vontade de chorar o povo desanuvia

O Poder da Terra


ninguém menciona o poder da terra
a arte da vida devidamente enterrada
os rasgos de bocas sequiosas que brotam
as cores ocres prenhas de vontade

vomitam lentamente todo um carvalho
cagam em direção aos céus grossos sobreiros
arrotam penedos, mijam minério
e descansam brutas de costas ao sol de inverno

devoram mares, rios, grutas de gelo e fogo
fecham os olhos aos animais afundam
o sol no horizonte com desprezo

a terra transpira vida morta
morde a chuva ...

Vera Cruz


São ideias sem conexão
mas suscitadas pelo mesmo paredão granítico
um império imponente das selvas erigido
e a moral que como as águas do alto se despenha
da mesma pedra a estátua e a mó se lavram
na mesma penha uns o seu topo alcançam
outros lá do alto se despistam
a mesma pedra no oceano se afunda
e afunda o peito entre as nuvens
e o sol de frente olha
do âmago da terra é filho crescido
O pão de açúcar acompanha lá do alto
as caravelas compadecido
dum povo que avança estarrecido
que no novo mundo a pisar se atreve

Orlando Tango

Lutos e Sungas Negras


Em sinal de respeito pelos fascistas camisas negras, por todo o povo cigano e ainda pelas viúvas enlutadas só uso sunga negra e recuso-me a discutir com alguém outra qualquer possibilidade.

Da preguiça à Macumba


No fundo eu sou um grande preguiçoso e só faço o que me dá prazer. Felizmente algumas coisas que me dão prazer são vistas pela sociedade como sendo trabalho. E por essa conjunção de pontos de vistas em relação ao leque das ações humanas, públicas e pessoais, e respectiva valoração monetária, ainda não morri de fome e posso encher a cara nalgumas sextas-feiras do mês.
Agora não venham é com merdas de burocracias, porque isso é obrigar-me a levantar o cu para coisas que eu dificilmente compreendo para que é que servem e para rituais enigmáticos já disse que não dou um tusto para burocracias, maçonarias ou macumbas feiticeiras vão se todos cagar dum precipício acima.

Vidas de Merda


A minha vida são estas águas. Sentia-me como um cagalhão de pois de darem a descarga, turbilhão e um sistema branco, duro e frio que se regozija com o meu afogamento. Ficaram só com o meu cheiro que é como quem diz a minha identidade e recambiaram-me para outro setor na esperança de nunca mais me voltar a ver. Por isso admiro a boa e velha latrina, a terra abraça a merda mas constrói algo com ela. Eu trato os outros como merdas mas abraço-os assumo o seu cheiro e segredo-lhes ao ouvido : “juntos venceremos”.
Em casa do meu avô havia uma torneira de descarga sanitária que dizia qiluvio. Em criança eu partia a cabeça tentando desvendar o significado, pensava porque não seria quiluvio, o que queria dizer, com os anos deslindei a possibilidade de ser diluvio ao rodar a torneira e ainda hoje penso na maldita palavra, penso também no diluvio vetero testamentário quando a ira divina puxou a descarga, talvez esteja próximo uma nova limpeza da face do planeta. Vários indícios históricos e geográficos atestam que houve um dilúvio à escala planetária. Recentemente um grupo de cientistas defendeu que os gases dos dinossauros contribuiram para aquecimento global. Penso que diluvio tambem contribuiu para uma renovação do ar.
Penso que vi aqui no Rio de Janeiro uma freira que costumava ir à Missa em São João de Brito. É baixinha e duma velhice louçã que as pessoas de Deus são conservadas numa espécie de juventude sorridente, lembro-me que ela costumava fazer a leitura antes da proclamação do evangelho e muitas vezes fazia a leitura da oração dos fiéis e que na altura de pedir pelos rapazes e pelas raparigas para que encontrassem a suas vocações, ela substituia a palavra raparigas por meninas porque raparigas no brasil se refere a uma mulher prostituta. Lá ia ela na Lapa perto da igreja do Carmo. Sempre sorridente atrás dos seus óculos redondos.
Se o tempo vai passando cada vez mais rápido, entreguemo-nos ao tédioe ao desleixo que hão de tornar a nossa vida mais longa.

Sobre o Terror


Qual será o maior terror? Cada tipo de local tem os seus medos específicos. Quanto mais se nota que o tempo devastou um lugar, maiores as possibilidades que nele se tenha instalado algum tipo de malignidade ou bondade, sim refiro bondade que pode ser tanto ou mais assustadora que as manifestações malignas.  A ancestralidade e a decadência provocam em nós um temor, também tudo que que se encontre num estado mais selvagem. O desconhecido tem um ascendente sobre nós. A desordem tem quase sempre algo de desconhecido. A desordem pode dar-se em vários aspetos, um lugar pode ser muito organizado físicamente, um claustro mas som estranhos ecoam nas galerias como sons chicotadas extremamente fortes num ritmo acelarado ou o som de multidões de vozes dando indicações avulsas num tom monocórdico sem que se saiba de onde vêm as vozes ou se todo o claustro estiver submerso debaixo de uma água verde ou se ao atravessar o claustro de súbito os céus se põem num lilás surreal entrecortado por clarões esverdeados ou ainda se de uma escadaria no centro do claustro que leva às caves começamos a ouvir alguém que chama em sussurros clementes seria também uma desordem se das portas que dão para o claustro começassem a sair lentamente várias bestas felinas de todas as raças que no mundo existem e ao deixarem a sombra das galerias subitamente se atacassem umas às outras com rugidos ferozes.
Sempre que mudamos de meio sentimos uma excitação. O hábito dá-nos um controlo cada vez maior sobre o que nos rodeia. Perder o controlo da realidade é um fracasso ou descuramos a nossa racionalidade ou perdemos a rédea da nossa emotividade.
(por isso nos provoca repulsa a avistar súbito de uma serpente, é abstruso um animal sem pernas e que não faz qualquer som que denuncie a sua presença). Por isso nos assusta profundamente se o telefone toca a meio da noite, felizmente tenho o sono pesado e nunca fui perturbado por tamanha irracionalidade. 
"Sim, com Deus! Liberdade , vida nova; ressurreição de entre os mortos! Que momento glorioso!"

22.5.12

Dostoyevsky na Prisão

é o mais careca

Cordas e Corpos


memória enforcada que o corpo
não absorve trauma despenho
da lava ribanceira de fogo
que mar não engole doença da alma

um segredo na lama pantanosa
um miasma de osso pulverizado
violência esquecida no esqueleto
que geme pranchas sob suas botas

o ânimo rompe em lascas de lágrimas?
o corpo dissolvesse em ácido rancor?
espinal medula exposta ao vento da vergonha

o despenhadeiro derradeiro da corda
que balança perto do candeeiro medonha
o retesar do pescoço o cordel estoura

Diniz Giz

Trip Luso-brasileira ou Brasa Lusitana


bebe bebe bebe leve cada vez
mais leve
quem se atreve a questionar
os homens que estão em greve
sem trabalho sem comer
sob o sol ou a chover
mil homens são um homem só
figura decadente um traste mete dó

de que estamos à espera
que passos estamos a dar
que vamos tão apressados
os olhos sem se fixar
corpo de máquina sem falar
que ímpeto tão cego te leva a caminhar
e de súbito aceleras
pelos corredores afora
todo engravatado
o rosto esbaforido
um ar desconsolado
técnica, técnica
desenvolvemos tanta técnica
que já nada fazemos que tenhamos de usar as mãos
e andamos tristes se as coisas não chegam ao correio
e acreditamos que toda a felicidade se compra com dinheiro
e corremos para o metro e não queremos suportar o nosso próprio cheiro
falamos rápido pelo telefone e embasbacamos entre companheiros
não aguentamos e não aguentamos a líbido dispara na internet
mas nunca tocamos numa mulher
não aguentamos as defesas caem online e abrimo-nos à loucura
mas nunca afagamos uma nuca, nunca beijamos uma boca, enfiamos a touca
não quero mais dançar o tecno não quero dançar eletrónico
eu quero dançar agarrado a uma dama eu quero dançar o forró

II

aqui estamos olhando atentamente os calcanhares
curvados em prostração reverencial
e nem nos atrevemos a levantar o olhar
elas bailam e nós veneramos
são as passistas no calçadão
que passam de patins de ar distraído
shortinho curto e cai-cai
com os fones nos ouvidos em plena abstração
passam loiras passam morenas
passam índias passam mulatas
e os nossos olhos giram presos de admiração
vergamos as cervis pasmados
vivemos presos de tal imigração
passam alemãs passsam chinas
passam brazucas passam irlandesas
quase deliramos com tal manjar rodopiante
que por nós passa veloz
que por nós passa sem olhar
de olhar semicerrado
com o queixo empinado
e quem nos dera saber patinar
e partir na sua esteira
e caçá-las em movimento
e amparar-lhes a cintura
suste-las no ar um momento
a brilhar no calçadão
deslizando em copacabana
patinando ipanema

III

daqui prá frente só fica mais penoso
uma já foi uma outra aguarda à porta
que te facilita o caminho e o torna mais prazeroso
uma é difícil a segunda é custoso
a décima ainda deixa culpa a vigésima é um jogo
mas o abuso vai apagando a imagem
do que foste e não és mais
és um adulto com cara de puto novo
com um peso na consciência
que dia a dia fala mais rouco
que cada dia a dia fala menos e te vai deixando louco
o castelo vai crescendo à tua volta
pedra a pedra te foste cercando nesse calabouço
agora estás sozinho
gritas alto mas não te ouço
vais morrer sozinho meu grande mentiroso

estamos a falar claro?
ou temos que falar mais alto
sentiram o nosso encosto
ou temos de espetar a faca
vejam nossos olhos raiados de vermelho

pal palmas
pal palmas
sal saltem
sal saltem
o dia dontem não vem
o dia dontem nãovem
sal saltem
homens ao centro
meninas na parede
pa parem
pa parem
não olhem
façam o que vos mando
não pensem

vamos caçá-las
as caçulas
sol sol
que assolas
os casulos das borboletas
e das

eu vou cantando o que sai
o meu amor não é firme
é flexivel como chicote
quando estou a vir-me
embora dou-te um beijo no cangote

IV

e já na noite rodeado de cuícas
sons estranhos dos becos e avenidas
tento fugir dos ladrões e dos polícias
me enfio por entradas e me perco nas saídas
o dorso do meu cavalo
prateado do suor
de correr atrás do amor
é um sinal minha amada

e nos céus tingidos sangue
um passarinho avoa
é um coração exangue
sob os telhados de Lisboa

falo de amor mas não sou que falo
é caetano e chico juntos
é bowie e lenon na casa
que nunca namorei neste mundo

a filosofia abeira do precipicio
faz-me suavemente balançar
prefiro umas mãos que em silêncio
carinhosamente me venham empurrar
caridosamente

V

caixa de lata
chocalha
com os tostões
negócios falhos

pobre portuga
largado
pelos mares do sul
já do sol tostado

o lusitano
casado com a mulata
de sunga e chanata
virou baiano

virou o vira axé
e o choro era fado
agora só come filé
farofa e feijão no sábado

trocou o azeite por mangue
e as rendas por cipós
cruz de Cristo no sangue

lalalalalalalalaços
que nos prendem
laalalalallalaços
de sol e luz
como espantalhos
fazemos o que nos mandam os céus
lalalalalaços
voamos entre as ávores
como as nuvens entre as montanhas
somos espantalhos
amassados de velhos trapos

cangote do corpo amado
a que apoio nos dias maus
cangote abençoado
onde assentei arrais

és um porto seguro
um abrigado cais

VI

caveira de rubi
onde prescruto o passado
o meu futuro entrevi
que o destino está traçado

entre as ondas dum tesouro
em que encontrei tal caveira
busco um artefato outro
que mude a dianteira
do meu novo convertivel
converta-se arrependa-se
arrenda-se esta morada
esta casa da alma

GNR e Chocos-com-Tinta


ouvindo GNR a caminho de Tróia
sinto me portugal sinto me insular
sonho lusitano sonho bailar
sou um reininho se vou a tróia

e agora instala-se a Troika
é uma cadela putana Tróia
que antra por trás
se a noite vem
se ela se vem fica mais louca

é Sesimbra ao longe
é uma barca
afunda-se o sol
sebastião salgado
o sol afunda
no mar salgado

descargas de choques
no porto de setúbal
choques de tinta
laranja e rosa
bloco na estrada
bloco na cavidade do dente central
devoro a carne toda
resvalo na rocha

Venham as Febras, Venha Mostarda


venham as febras, venha mostarda
salta a cancela, faz-te à estrada
foge com as cuecas na mão
que o país nada tam na mão
e tenta caçar-te pelas cuecas
como à tua prima
que foi caçada em contribuições
faz-te ao mar
e não olhes pra trás
engole o oceano se estiveres com fome
vive na praia
agarra o último camarão
antes do pôr do sol
e se o papão tentar segurar o bolso
morde-lhe a mão
não te prendas com as dívidas

Nada sem Ar


nada se entende nada sem parar
que quem nada não se afunda
e se em nada se afunda
já mais se afoga

quem escreveu esta barbaridade
prendam este selvagem
abracem-no na esquadra
que lhe sirva por muitos anos de estalagem

despejem mosquitos e outras pragas
nas frinchas da janela
tirem-lhe o ar

Tragádias


maremotos de lágrimas
coados num boletim de tragédias anual
quero engolir os teus mosquitos agora
apreciar as crostas de sangue ressequido nos pulmões
oh morte adiada em frigoríficos sociais

Abat-jour de Enfartos


um abat-jour de enfartos
uma malga de ácaros
e um relógio que bate em retirada
os passos sobre a água das pombas
fedem
fedem
os canos nas trapas
fedem os canos pluviais das casas
choram os líquenes nos beirais
e ao fundo as paisagens desfocadas

Mosquito Dengoso
"não era sarado, subnutrido"

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...