10.8.12

Ã? Ah!

como uma sandes e um ucal
alegra me a manhã não gosto de chá

Só quero chegar lá de pança cheia -8 ou 10?

A eles se entregava não a mim a mim não queria
minha mulher é melhor conhecê-la delicie-se em vê-la
brinque com os meus filhos trespasse a frescura dos meus umbrais
Mentirosos aplaudidos no vento não à mais casa só o esgar
barbárie abrupta de tesão alicerces de corrupção
Sida, sida, nos lábios ensanguentados de paixão
Poemas de rua assentes no macadame hinos de devassidão
e esperma. interessa só diversão e espera e senta no meu caixão
diligência desenfreada rasgando a terra das sombras
recostai-vos sobre essas cinzas atafindas dum escuro profundo
vinde comigo brincar ao fim do mundo.

(uns são filhos da puta coitados eu sou marido dela)

7.8.12

O Rio de Janeiro Cheira-me a Vermelho

Praia Vermelha uma cunha de mar
Entre os morros estreito o céu dramático
Desenho ao longe preguiçosas ilhas
na costa uma aura militar esmagada

entre o granito refletindo todas
as gerações em dias de sol após
noites de chuva que a neblina da mata
atlântica depois esqueceu meu Deus

Ao alto dos morros a proteção divina
os conventos brancos pontuam serranias
lá em baixo os portos junto às baías

No meio escravos, gentes, mercadoria
secam-se malárias, expurgam-se espíritos
matamos índios Tupis Guaranis

Despertares

A mim levou-me um sonho a lá acordar
vida sustida, folgo bocejar
eras luminosas passam em simples
intermitência, sono, toque de sino
tocam nas serras os sinos mais finos
soam nos ecos os sinos do meu sono
sonoro símbolo entrecortado ao longe
pelos latidos ainda mais longe um silvo

uma vaga impressão de vale esquecido
vai caindo uma brisa sem sentido
num sobresalto um bocejo sem som

Finda-se um sonho mas ficam-se umas sombras
Um outro eu tenta mergulhar de novo
Na fugacidade tão doce... Despertador

Exame Social

Quando fui fazer o exame à UFRJ para entrar no mestrado de urbanismo acordei muito cedo. Andava como um morto. É bonito ver o nascer do dia entre os morros. Comi um pão na chapa e um café com leite no boteco do costume.
Tomei o ônibus para o fundão. A universidade fica numa ilha na baía de Guanabara. O percurso é por uma avenida rápida cheia de trânsito, vai atravessando várias favelas e zonas industriais
semi-abandonadas, há água por todo o lado os meandros da baía que entram e saem e braços de rio fedorentos ladeados por frondosos mangais.
ao longe destacam-se entre a neblina as silhuetas dos morros abruptos e favelas por todo o lado.
Ao longo do trajecto temos um vislumbre da extensão e da quantidade de povo desta cidade. afastados do centro continuamos a ver gente aos magotes e comércio de rua, frutas, legumes, botecos, chopperias e casas como cubos de tijolo escalavrados morro abaixo.
o sol crescia e o fedor intensificava-se. Um carro flutuando em cima duma jangada improvisada...
A universidade é uma ilha plana bastante extensa onde espalharam edifícios modernistas todos afastados entre si. As distâncias são de tal forma que existe uma rede de ônibus dentro do campus que não se paga e faz a ligação entre as várias zonas do complexo.
Nas margens da ilha entre as árvores vêm-se as sombras dos barcos dos pescadores locais.
As mesas da univ são as mesmas que serviram nos loucos anos setenta e estão todas chacinadas. No exame tive de falar das desigualdades sociais e da segregação urbana. E da esperança de uma cidade mais equitativa quando forem os jogos olímpicos, só não cantei a Internacional porque disse que tinha o feijão ao lume "força camarada, não se esqueça da farofa!"

oh francesinha

oh francesinha do cabelo amarelo
dos olhos verdes e cara de canário
as tuas ancas largas e o peito espigado
e o teu rosto de alpista salpicado
fazem-me tordo
fazem-me galo
e canto grosso
e vôo torto
ando todo apardalado
cantas entre os varais um breve trinado
como asas os lençóis ao vento
brilham as penugens loiras ao sol
canta o mundo a tua presença
e o engaiolado
nem do chão saio
como um pinto como um gaio
entre as grades piando baixo
mas para minha grande sorte o teu pai
esse grande gavião
caçou-te e tirou-te a liberdade
e fechou-te em silêncio
no meu caixão
bendita tradição
que te trouxe confortavelmente ao meu ninho
e agora com essa cara assustada
a asa curta e o corpo gordinho
eu chamo-te carinhosamente a minha galinha

A busca da música da popular

o morro vestido de tijolo oco oco
louco
caboclo
o cubo de terraço ao sol
o sal na carne em brasa
e a pipa do puto a voar
os pensamentos
do povo
como um ovo
rola pela favela
e lá vai ela
toda popular
com a anca a bambolear
bamboleio bamboleia
uma carona uma boleia
no funk mais americano
uma pintalgada de piano
um suco de maracujá
ou farofa e guaraná
dá dá que o filho do povo pede
dá dá que ele merece
e se o sentimento antes da noite cresce
oh cresce
ela move-se
ela remexe
e nas suas costas bate
o sol, o mar e dedilhar do violão

Rio Moço Desci

rio moço desci das escarpas do inferno saltei os picos e rocei o lombo em rochedos impassíveis
senti o gosto da eternidade nas mós ao longo das levadas

Feira de S. Cristóvão

gente feia gente feia
cruzando os labirintos da feira
gente desfigurada
criaturas sem alma
gritaria
berreiro
uma criança pelo asfalto arrastada
ganância nas mãos vazias
lobos nos estômagos enjaulados
lixos nas bancas em cascata
nuvens de odores de putrefactos
gente feia
gente feia
cruzando os labirintos da feira
carne podre pendurada
licores coloridos de abjecção
tecidos bafientos
fruta bichada
pullovers furados pela traça
tupperwares que o sol deformou
gente feia
nos labirintos da feira
que mercadoria torna mais feia
bolor no pão
enevoado pelo diesel dos geradores
uma velha à venda no talho
um gerente com cara de porco
uma dama retalhada num banco
um senhor caído bêbado no mictório
cheiro de alho podre e vinagre coalhado
e uma chuva ácida corroendo o palco
onde cantam
onde cantam
as alegrias do carnaval de São Cristóvão

3.8.12

Coruja negra clara de lua cheia.
ramos tristes lenta sobre a morte.
Ao longe o mar só, sem a quem
histórias contar entre o vento,
Perdido Velho velho por dentro.
As suas ondas são a asa negra
que a todos nos cobre seus enteados
filhos da tempestade pobres diabos
espremidos contra as rochas da costa
subjugados pela sua imensidão paternal
desde cedo mergulhados no medo
nunca mexer-nos sob os escombros
da madeira podre duma montanha,
De eternos pesos que não existem.

Atoleiro

Desenterrado das areias só conheço
a noite e vejo os fogos na outra margem
do pântano livres da multidão
dos grãos os galhos veneram a luaA água e a lama lambem-se uma à outra
em polvorosos lamentos as raízes
Entumescendo ao crisol dos ventos
gritam os fogos carpindo as árvores
decompostas no atoleiro da noite
A carne envolve o tronco à árvore o sangue
prova a seiva compadecida dos lenhos
sinal da casca e percorre os leitos
desde as raízes identifica os séculos
eleva-se, busca os ventos com os dedos

de pântanos

são reflexo pingando na superfície
do cadavérico lago verde uma pinga
devolvida em bafo de lama e pântano
uma lágrima de pureza transvertida
em massa lodosa vómito castanho e morno
um soluço grosso nas copas das árvores
reverbera na neblina doente que mata
os animais cadáveres movediços
que enriquecem as águas paradas de troféus
risíveis que se pisam e esmagam
como moleirinhas de infantes crianças
perdidas entre as silvas transbordantes
de lama e espinhos cravados nos olhos
da serpente lenta que nos contempla

Afastando o manto da manhã

Afastando o manto da manhã

Os confins pariram-nos em rubi
maçãs dum rosto de rasgo infinito
o brilho do sol abre-se em sorriso
O rio vertido tinto lá ao longe
o cabelo negro sobre o pescoço
Cedo se cresta o esteado vale
às escadas de xisto furioso
O estoirado vinhedo vermelho
é a pele morena que te cobre
cheia de explosões rubras tuas uvas
meu corpo escorre sempre pelos cercados
vagueando em carreiros sem nome

beijo os rácimos-chagas do teu pelo

caminho no alcatrão

Caminho no alcatrão ao longo do muro
de tijolo antigo com vidro de garrafas
agarradas ao betão e imagino
os braços esfacelados as veias

cortadas O sangue secando ao sol
sem alguém que me ampare na morte
Aguardo à frente à sombra da pesada
figueira exausta que apoia os braços
carregados de lampos figos no muro
e sangra dos cotovelos a seiva
branca e viscosa desenhando as gretas

dos tijolos carcomidos em pó
dentro nos podres ocos que se abrem
lentamente em miragem de calor
A existência de erro e limitação
torna tudo mais humano e palpável
eu quero sentir a realidade com as mãos
e que a engenharia não faça coisas
que não se possa abarcar com a vista
do alto duma montanha
quero viver entre o labirinto
de ruas curtas e sinuosas
conhecê-las melhor que o visitante
quero dominar coisas só minhas
só do meu povo só da minha família

2.8.12

Escadas


eram escadas sem fim até onde agora eu estou
entre pátios interiores marfim no seco das infâncias
olhadas inertes lá trás nas escadas da cozinha
que dão para o quintal todo enxáguado de armários
ao final da tarde quando sobes a escadaria de madeira
para tomares o banho antes da janta e interiormente
sobes outros degraus que ninguém vê que hão de
levar-te longe uns degraus de pedra que sobes
de mansinho por entre os ramos da casa de hera
os degraus são os livros da biblioteca bafio range
plangem os degraus porque perdeste a ligeireza
da vara de vime chumbo denso das escadas que
ecoam por entre as chapas metálicas que desaguam
no saguão toda aberta de escadas a noite espumante
tilinta de cristal em cristal fragilmente a escada
em espuma desce alegre de copo em copo de corpo em corpo

31.7.12

Cabo Mondego


Velado


tens de ficar assim velado?
corta os laços do teu véu
deixa-me contemplar amor meu
tuas chagas de sangue martelado

só nos separa este cristal
pressinto o teu cheiro encarnado
sudário de rosas reinando do altar
quero beijar as pétalas do teu lado.

Farol


Soterrado austero farol
envolto nuvens da devassidão
ergues teu rosto luminoso
expelindo voraz o vómito
do mar rouco fendendo
a ansiedade uivante das chuvas
penteia o teu cabelo de sargaço
e atrai para as tuas rochas
dentilhadas de marisco alquebrado
os dorsos sensuais das putas das sereias
e fá-las sangrar todo o Inverno
estou a falar convosco como a uma divindade
que me escuta e protege
e peço-te como uma criança
orgulhosa de seu pai todo poderoso
dá-me esse prazer de vê-las sofrer como cadelas

4 Sonetos


Agraços olhos sobre os lavradios
ensombram antes da noite os vinhedos
afagam seus dedos de morte frios
os infantes frutos imóveis de medo

serpenteia negro o suor pelos regos
em oclusas levadas de silêncio
envenenando a sede de loucas cepas
as filhas de uma estúpida inocência

Esse fogo tocado com o olhar
não esmorece e decepa os sarmentos
com a inércia em queda milenar

Oh cinza não reveles os seus passos
liberte-se a chuva em pensamentos
amargos e chorem os verdes agraços


medicinal, a farmacopeia etérea
guardada na cavidade da rocha
mergulha com soco violento como cai
a noite. carregam sobre a árvore os
batedores fustigam furiosamente os frutos
na lixívia abrasadora dos rastos
inscritos no bronze, moldam as marmóreas margens
à espadeirada. quem vergará os gonzos...
ajoelho-me violentamente sem esperança,
praias e praias vazias varridas do vento
impiedoso. marés violentas de bronze.
sangra o tronco num impulso de graça

o puro orvalho da manhã de damasco


a noite não nos quer dizer nada, adianta
caminho, cruzamos todo o ouro no terreiro
seco. não chega o espaço, o algodão arde
em fúria, cai o metal do desejo em chuva.
a mãe em busca dos filhos levados no rio,
os seixos do rio cegam na transparência,
afogados em pureza, cegam, aquecem
o peito das crianças expostos ao esbanjamento
do sol, a estocada do escultor no peito da vénus
de calcário cega. sob os arbustos a sombra
das silvas, o xisto que enche a bruma ampara a
frondosidade do carvalho, marca a chegada
da noite final da terra lavrada em torrente

de fogo, o fogo que não se consome.

Anos sobre anos de leito em leito
Sem mover o pó que envolve as coisas
Entre regos silenciado rio estreito
Do segundo que toca mas não poisa

Vogam o horizonte os vagos olhos
Divisando desvendá-lo no vento
Mas se ele amaina e seu sopro perde a voz
Voltam costas em busca do momento

E os passos esses passos dão lhe vantagem
Atravessa as casas praças e ruas
Não sucumbe à paração do pensamento

Foge perdido sem cruzar ninguém
quando muito cruzado a temor por pernas nuas
que as águas crescem no caudal violento

a favela


a favela é o maior arquivo de arquitetura popular
do mundo. é um património que deve ser preservado.
é uma composição cubista e por vezes plasticista
 porque a unidade básica é o tijolo e a lage.

Separo a carne como só as cartilagens
numa farta malga de alumínio
O nível do vinho escuridão engarrafada
rubra clepsidra do meu estado
sussurra o esvaziar das horas
estou sempre parado
em estado de meditação artística

Baldios do Brandão


Chaparro do Homem à sombra das sombras do Tempo
amparas as tardes nos teus ramos
impões silêncio às orgulhosas asseiceiras
que se arrastam indomáveis nas planícies
tentei vaguear nestes destroços de paisagem
sondada no húmus do Brandão
Chaparral imenso que escondes o Poço da Partilha
dedilha a cigarra entre uns canaviais
ao longe na Barragem do Vinte e Dois.
Cada talhão deste solo, cada chapadão
largado à selvajaria das estevas
me implora para que ali me enterre
me alimente do que céu dá
me irmane de cada coisa e gaste uma eternidade
contemplando cada folha e cada pedra
todos os humores dos céus e conheça
o ardor e o gelo da terra
Sesmarias terra do inculto e do abandono
onde pastam a solidão e o vento.
Maninho estéril que te levantas infecundo
congregação de baldios solos incultos semeados de ignorância
respiram ao longo dos séculos sem donos que vos dominem
primos das Enxaras e das charnecas avancem sobre vós as estevas
a chupar-vos o sal das rochas brancas estilhaços de sol
lamente-se a cornicabra sedada do chá da alcachofra velha.
retirado entre sesmos escondido dos aceiros
fujo do fogo que corta a eito
a plantar-me no alto de todas as serras

Fagulhas


adormeço embalado na liquefação do tempo
Oh podre tédio quem me dera ter um piano
que soltasse notas ensopadas…

O suor que ramifica nas toalhas e em vão chora sobre a pele
traça a geografia errática da angústia líquida
que alimenta os cancros

o corpo pede clemência e corta a posta
De coração que fica em cima da mesa

o sono seco por onde lavram as memórias

Oh aventura que às vezes
Tão em vão pareces, em que embarco
À busca do que sempre tenho

Ardor Mistico poetico


com a corrosão do limão
infligindo dor nos músculos
e o que faz alguém no meio
de semelhante consideração
poética?
prosseguindo:
angioma que aflora
ardor de prazer que faz ebulir
chicoteio o ar indiferente
se antes havia uma alusão
ao uso de drogas e à dor,
talvez agora possamos vislumbrar
S Paulo fustigando uma ideia...
a vontade maligna sibila
a chuva poluída sobre o rádio
ora aqui a estocada realista
xutopontapiana
faz mais tristes
sobre a mesa três tocadas bananas
três arrasta para aqui a cabala
falhas na parede ajeitadas com bochechos de cimento
cebola avinagrada pelas portas do frigorífico
depois duma sesta esmurrada nos olhos
enfim, parece que alguém está a descrever
tristeza, desconforto e impotência

Milimetros


OH látego do meu remorso
flagelo da minha culpa
mensura do teu amor por mim
és uma pequena régua de 20 cm
para medir o meu corpo
entranhada na carne radiografas
cada vértebra calculas
a intensidade do piscar dos olhos
estás nos milímetros da minha pele

Cairemtodosostonsdazul


Cair em todos os tons de azul
na leveza do ar que não me carrega
Será apenas um segundo
um sonho
do alto dos prédios ruino-me
e o embate faz a
Iluminação de sódio
Dos becos malafamados
sou a luz do que vigila
desvaneço-me com a madrugada
tenho sono

Flutuar em todos os tons de azul
leveza do ar que não me carrega
Será apenas um segundo um sonho
desde o crepúsculo à noite negra
dos altos edifícios me arruino
o embate é a iluminação de sódio
Dos becos malafamados sou luz
desvaneço-me com a madrugada
eu sou o frio que a lua boceja
que entre as nuvens de morcegos vigila

Sol em Esmoriz



E que um dia tudo seja sol
ao som repetitivo e melancólico
do dedilhar de duas ou três
cordas de guitarra
olhava o pão de açúcar e pensava
em todas as derivações sfumatto
neblina, pardo, fantasma, enevoado,
vapor de água, fumo, miasma
eu estava em Esmoriz em 1987 naquele Verão
em que o mar engoliu a praia
no dia seguinte foi um fartote
passear por entre os paus das barracas onde ainda
havia poças de água e muito lixo, pauzinhos e troços de plástico
e beatas de cigarro e algumas alforrecas, encontrei muito dinheiro
nesse dia levava as notas e moedas à minha avó, eu tinha sete ou oito anos ou talvez menos acho que devo ter tido direito a um gelado também encontrei uma ameijoa viva mas foi na costa da caparica também nesse ano e a minha avó comeu-a viva ieerrk nojo
tenho a visão clara dela minha companheira mais amiga de criança tomando banhos de mar gordinha de cócoras com água pelo pescoço e eu de pé também com água pelo pescoço de mãos dadas girávamos dando saltinhos como dois astronautas sem peso.

Tuareg


Como um Tuareg ando em teu decote
entre as dunas quentes de São Martinho
é a mesma carne que no Saara
o mar espelhado nos teus olhos
e a miragem do teu beijo
eu sou o camelo e tu o oásis

Laberíntos Infernaes Remix


um pesadêlo:
Modorras post-prandiais
Reclinadas sobre os corpos
De pálpebras maceradas
Em delírios ambrosianos
Os espíritos fremem
Viandas imperiais, alcachofras
Corno gratinado, puré de ostras
No percurso inverso vertem
Ante o vomitório quem se prostra

vi um torvelinho de paquidermes
em ventania repisando o céu
nuvens elefantinas em manadas
bramindo as árvores com trombas de água

O céu nacarado reprovava as nossas intensões
e chorava impotente

Só em contra-luz…
vislumbro os seus reflexos
na cadência manuseada
dos negativos cinemáticos
de memórias desconexas
stencils com formas de bananas
e travo amargo a sémen pelo quarto
tranco a porta

Saimos em pijama atolados nos mesmos sonhos negros
e as mesmas tentações pornográficas
cá debaixo olhamos:
as trapeiras ao céu imploram com olhos tristes
furtadas nas águas sombrias dos telhados
almas esquecidas de pobres e humilhados
choram de noite o Tejo em desempregados gemidos

filmes a preto no branco:
um frade meu freguês
compra fruta e fio de arame
prefere pagar a pronto
à minha oferta à Madre Igreja
aparece em setembro
com dia e hora marcada
a mesma mercadoria
sempre carne, salmoura
e feijão frade

percorremos juntos as cidades...
Eu à beira da marca amarela do metro e tu
trespassas a turba
em passada curta e hirta
nada te perturba altiva
de olhar que morde
um drapejo que mal te cobre
nos lábios um baton alegre
num sorriso marca d'água
de quem sofre

brincamos com as palavras num café em abertura:
tu:
segue o mestre em soneto vanguardista
com subtil aconchego plasticista
eu:
não tenho exitado perante a vida
pelo contrário têm sido só derrotas

e sonhamos acordados com outras paragens:
Baratas Tropicais
Camisas tropicais
Aquários com néons
Palmeiras
Gel no cabelo
Tez morena
Baratas junto dos boeiros
Iluminados por lampiões
Através da humidade tropical
As baratas
O cheiro intenso
O clichè dos carros fora de moda
Frutas garridas
Salvas de prata
Cavam na areia das praias em busca do império
Alguns charutos
Olhares vagos
As baratas tropicais
Cais barcos atracados
Pessoas baixas de estatura
Bebidas fortes
Ilhas baratas perfumes exóticos
Alamedas enquadradas por palmeiras
Sem história
Ansiãos
Tédio modorra
Baratas

Andamos sempre pelas mesmas ruas
a cada passo sonhando merdas diferentes
como um grande corredor comprido
com uma sequência de tapetes diferentes
que despertam fantasmas novos de
cada vez que os pisamos

Construímos sinais e damos os braços uns aos outros no meio
desta fumaça infecta para que não caiam nos mesmos buracos que nós

Quem construirá cúbicas colmeias
No baldio onde explode constante
Bolas pedras gritos melopeias
Reboliço do jardim de infância

Uma dama em coma na avenida de roma
Ambulância lancinante noite de Natal
Sigo seguro da minha insegurança
Toda a vida em viva vigilância

Nariz e boca sufocante de sangue
O alarme vermelho o garrido pânico
Nas orelhas os zumbidos das abelhas

A vertigem em queda da criança
O rapaz de rosto sem réstia d’ânimo
O homem maduro com duro medo

tu:Aquele abraço
eu:Aquele também para ti muito obrigado adeus

Mais Meditação Mística mmm

Entro o abismo branco e o abismo vermelho
Caminho na helicoidal fímbria que os mistura
Desisto de andar resplandeço de tontura
O silêncio de ouro encharca-me de medo

És rosada e tens a úngula fendida
mergulho a fundo na tua ferida

são túneis percorrendo túneis
a si própria se engole a víbora
sonhei através do grande vidro

Chicoteeia
Os seus frutos apodrecem agora no chão
Gritei-lhe
Nada escondas do sol
Então só me via o halo
Excitava a parte gorda dos braços vergastados
Antes de afogá-la

e sobre as duas como manta desce a noite
respiram máquina e árvore lado a lado
brisa balsâmica velada de divindade
da plenitude do aquário de mil sóis

é horizontal o crawl voraz da máquina
o barro cego funcional plasticidade
moldando ao labirinto do engenho as paredes

Corpo e alma carne e espírito geme a árvore
Esticada entre polos de verticalidade
Co-princípios que lhe garantem a unidade

e dentro da nossa parelha foram terminando os temas
já só murmurávamos monosilabicamente tentando achar nexos
no que parecia demasiado simples:

eu:Só não vê quem não quer
tu:Quem não crê não é bom
eu:Não é bom nem mau
tu:Se o sol se põem atrás do mar
eu:Eu estou atrás de ti

tu:Só no mar o sol se põem
eu:Pra quem tá ao pé do mar
tu:Mas se tás ao pé do rio
eu:O sol no rio se irá deitar?
tu:Só se o sol fosse um navio

tu:E o rio um céu sem sol
eu:É que sol há um só
tu:Nem no céu voga o navio
eu:Mas o rio faz o mar
tu:E meu navio foge do sol

e ela partiu


O meu pai não é teu pai
O teu pai não é meu pai

Oh a luz de tê-la por mãe

Só a dá a quem quer
A luz
Só a dá a quem quer
Mas e quem não a tem
Quem é que quer
O que não tem se não viu
O que se lhe dá
Quem dá o que não tem
Quem vê o que não tem
Doi te mais a dor se estás só
Sim ou não
E mais não diz
Vês o pó que cai do céu
Cai de pé sob esta mão que vês
E dá –lhe tom de pó
Um a um cai grão a grão
Sob a mão de pé

Pão e sol
E ar e luz
E mais não quer
Vai mais o cão
Sem pai nem mãe
Com fé em si
Nem pau nem croa
Ao sol ou sob a lua
Lá vai lá vai o zé
Com pó nos pés

Sol e sal e cal
E sob os pés é pó mais pó
Vi a luz sem fim
Vir sobre mim
Sim ou não e mais
Não quer o Deus dos Céus
Sou réu do mar
Pus as mão nas suas mãos
A vi vir a mim
Um som que vem da sé

Dou um nó não dou

e eu garantia-te como um paladino embeiçado:
Afãs – onde se ajuntam os abutres
Lutas corpo a corpo – é no coração
Passavas e escapou-se o panfleto ao pára-brisas

Já em criança sustinha
A respiração com medo
Das doenças ao passar
Pelo talho entre as carnes
Onde cospem as varejeiras
mas se tua carne passa inspiro fundo
na ânsia de te padecer

e os pensamentos eram entrecortados pelos gritos duma besta
uns apartamentos acima:
Estuporadas meias têm um elástico
Tão forte que no final
Do dia parece que andei de grilhões
Dos sulcos na barriga das pernas
E com os pés inchados

e a tv sibilava:
queremos ser bons
almejamos a excelência
que reparem no nosso esforço
não queremos
transparecer naturalidade
e vida airosa
vivemos à tabela
sem desperdiçar um minuto
murchamos nossas potências
em favor da força do grupo
mas à noite libertamos
de novos as bestas
:manifesto zappatista:

Convento dos Capuchos

palmas das mãos nestas pedras de musgo afago o teu fôlego neste claustro oh Deus do fresco da capela me arrepia o teu sopro do teu cla...